2018-11-26

Fotografar árvores


Os leitores sabem que gosto de árvores, de apreciar desenhos de árvores e de me queixar da dificuldade em fotografar árvores.

Ontem gostei desta árvore e tirei uma foto. Como habitualmente foi difícil encontrar um enquadramento nesta paisagem urbana em que não aparecesse algo que perturbasse a contemplação da árvore. Retirando o  mais possível da periferia obtive este enquadramento que seria razoável com excepção do sinal de Stop. Achei que as nuvens favoreciam a presença de azul em excesso e tirei um bocadinho dessa cor além de aumentar ligeiramente o contraste tendo obtido esta imagem


Depois clonei partes da imagem para fazer desaparecer o poste do sinal stop. Dado que a relva tem uma textura regular bastou fazer a clonagem com o que estava próximo da imagem do poste numa posição horizontal, uma vez que a sombra do tronco da árvore se desenvolve  horizontalmente sobre a relva, obtendo esta versão:


Lembrei-me de fazer isto para mostrar como é por vezes muito fácil eliminar pormenores indesejados das fotos, sem ser um perito, demorei um ou dois minutos a eliminar o poste do sinal de stop. Com mais algum estudo julgo que descobriria métodos não muito complicados de colocar no sinal de stop uma cópia de outra parte desta árvore mas como não descobri limitei-me a colocar um disco verde em cima, obtendo esta versão:


Não fica bem, mas será talvez menos conspícuo do que o sinal de stop do original.

Pensei que esta árvore seria uma possível origem destes desenhos de árvores do pintor indiano Nihal Chand


mas afinal parece que as cores estão invertidas, na foto as margens das folhas são amarelas e o interior verde-escuro e no quadro indiano passa-se o contrário

2018-11-21

Especialistas no Acordo Ortográfico e no Museu das Descobertas


O Vítor Santos Lindegaard publicou em Junho/2018 no seu blogue “Travessa do Fala-Só “ um post intitulado “De especialização e especialistas” em que, ao contrário do habitual, eu discordava de muitos pontos nele contidos. Na altura prometi escrever sem pressas alguma coisa sobre os temas tratados em que, depois duma introdução genérica sobre a especialização e os especialistas, vai buscar como exemplos as discussões em Portugal sobre o Acordo Ortográfico de 1990 e sobre a criação de um Museu das Descobertas.

Na primeira secção do post intitulada “Da especialização propriamente dita” concordo praticamente com tudo, eu escrevi num post intitulado “A realidade objectiva: dizem que 2 mais 2 são 4. Concorda?” sobre o mau hábito dos meios de comunicação de pedir opiniões sobre assuntos específicos, em que o público em geral não tem nem formação nem informação para os comentarem.

Já na secção seguinte “Da desvalorização dos especialistas, e mais duns que doutros” não me parece criticável que exista uma gradação no peso que se dá às afirmações dos especialistas à medida que o objecto do estudo em que se especializaram de vai tornando mais complexo, como aliás é apontado no texto do Vítor, da Física e Química, passando pela Biologia e pela  Medicina até as Ciências Humanas designadamente a História, a Sociologia e a Economia Política.

Talvez a minha discordância seja mais de grau do que essencial, dado que o Vítor constata que será espectável um menor peso das afirmações dos especialistas à medida que aumenta a complexidade do tema mas talvez ele veja isso como algo a eliminar ou a lamentar enquanto eu considero essa gradação como uma inevitabilidade bem-vinda. É essa gradação que me permite criticar por exemplo as Agências de Rating e seus especialistas.

Embora concorde com o Vítor que é importante ouvir as considerações dos especialistas de qualquer uma das áreas de conhecimento, e que é um disparate considerar que a condição de especialista é um óbice à manifestação de opinião, existem áreas em que, depois de ouvidos os especialistas, a decisão não deve ser deixada a um conjunto constituído exclusivamente por estes.

Passando ao tema do Acordo Ortográfico de 1990 constato que a minha previsão neste post da possibilidade de não aprovação do acordo por alguns dos países que adoptam o português como língua oficial

«Não valerá a pena referir que as ortografias do Brasil e de Portugal irão provavelmente divergir, basta ir ver o corrector ortográfico do Microsoft Word para constatar que existem meia-dúzia de variantes para o alemão e imensas para o francês, o inglês e o espanhol. Mesmo no italiano há o de Itália e o da Suíça. Caso alguns dos países que usam a língua Portuguesa não venham a aprovar o acordo aparecerão certamente mais variantes além do Português de Portugal e do Brasil actualmente existentes.»

se veio a verificar, entre outros em Angola e Moçambique e mesmo sendo leigo no tema, não posso deixar de constatar que um dos objectivos principais referidos pelos especialistas do Acordo Ortográfico de 1990, de uniformização da ortografia do português, teve resultados contraproducentes pois não só se mantiveram muitas diferenças entre a ortografia em uso em Portugal e no Brasil como se estabeleceu maior variedade ainda com a manutenção oficial em Angola e Moçambique da ortografia anterior ao Acordo de 1990.

Todas as grafias têm alguma independência em relação à pronúncia. Se assim não fosse ter-se-ia que usar grafias diferentes em Portugal para as variadas pronúncias que existem no país, por exemplo no Porto, em Lisboa, em Coimbra, no Alentejo, no Algarve, nas Beiras, etc. Mesmo numa mesma região existem pronúncias diferentes de pessoa para pessoa. O facto de a ortografia da língua inglesa dar sugestões muito pouco explícitas sobre a pronúncia das palavras não impediu que quer a Inglaterra quer os Estados Unidos da América fossem dos países onde a alfabetização da totalidade da população se concluiu mais cedo. O facto de  tantos escritores, criadores da versão escrita da Língua Portuguesa, se oporem ao Acordo revela um vanguardismo dos linguistas que o desenharam e que, em vez de convencerem os criadores da escrita, se dedicaram a influenciar os decisores políticos que por sua vez convenceram os deputados da Assembleia da República a votar favoravelmente. Continuo surpreendido por apenas 4 deputados terem votado contra conforme diz neste texto da revista Visão:  «... Manuel Alegre, PS, Nuno Melo e António Carlos Monteiro do CDS e a deputada não inscrita Luísa Mesquita (ex-PCP) votaram contra.»

Quanto à defesa da missiva de mais de uma centena de académicos criticando o uso do termo Museu das Descobertas” não me parece feliz a defesa dessa missiva, citando considerações do historiador Paulo Sousa Pinto.

Por exemplo neste extracto do texto dessa carta
«
Se existem vantagens na criação de um espaço museológico deste tipo, porque é que ele não deve intitular-se 'Museu das Descobertas'?

Desde logo, porque essa designação cristaliza uma incorrecção histórica, razão pela qual, como historiadores e cientistas sociais, não podemos estar de acordo com ela.

Apesar do vocábulo 'descobrimento', no singular e no plural, ter sido utilizado nos séculos XV e XVI para descrever o facto de se terem encontrado terras e mares desconhecidos na Europa, a verdade é que, na quase totalidade dos casos, ele apenas se refere à percepção da realidade do ponto de vista dos povos europeus.

É inquestionável que Vasco da Gama descobriu o caminho marítimo para a Índia, para quem, naquela altura, vivia na Europa Ocidental.

Precisamente porque um dos aspectos que resultou deste e de outros episódios de 'expansão' foi o contacto entre povos de culturas muito diversas, é que é tão importante considerar o ponto de vista e a percepção de todos os envolvidos.

Para os não europeus, a ideia de que foram 'descobertos' é problemática.
»

vai-se ao ponto de afirmar que o vocábulo “descobrimento” cristaliza uma “incorrecção histórica” quando a seguir se reafirma a existência desse descobrimento criticando contudo o uso da palavra porque “para os não europeus, a ideia de que foram ‘descobertos’ é problemática”.

É para mim completamente incompreensível que seja problemática a ideia de que alguém tenha sido descoberto, a descoberta faz parte essencial da espécie humana, nós somos seres que descobrem e que aprendem.

A existência de outros povos não depende de eles serem ou não descobertos por estranhos, não percebo o que poderá levar alguém a pensar que foi a descoberta da sua sociedade pelos europeus que os colocou na história do mundo. A partir dessa descoberta passaram a referir a sua existência em documentos europeus, tudo isto me parece natural.

Os povos que viviam na Europa foram objecto de descobertas de variados povos. Alguns deles estabeleceram-se aqui e ficaram por cá, como entre outros os povos germânicos, os húngaros, os finlandeses. Outros, como os Mongóis no século XIII, deixaram um rasto de destruição e foram-se embora. No século XX fomos descobertos pelos turistas e pelos investidores japoneses, depois os sul-coreanos, os chineses de Taiwan e de Hong-Kong e ultimamente os turistas e os investidores chineses. Turistas, emigrantes e investidores indianos têm também descoberto a Europa.

É curioso também que nessa carta considerem  que a palavra “Descobrimento” que terá sido utilizada nos séculos XV e XVI para descrever factos de uma forma que não foi tão exaustiva como poderia ser agora, a palavra “Descobrimento” tenha assim que se restringir ao âmbito das descrições feitas nos séculos XV e XVI. Talvez alguns historiadores gostassem de serem eles a definir qual o significado do vocábulo “Descobrimento” ou “Descoberta”. Infelizmente para eles essas palavras não são propriedade dos historiadores e o seu significado e o âmbito do que descrevem vai evoluindo com o tempo, aliás como toda a História que corresponde à descrição do passado considerada mais relevante por cada sociedade no tempo em que existe.

E acho natural que num museu na Europa se privilegie o impacto que os Descobrimentos tiveram em Portugal e na Europa, o que não impede que se considere também o impacto que tiveram nas outras sociedades. Mas parece-me que essas sociedades deveriam elas próprias fazer museus que falassem do impacto que nelas tiveram a chegada dos europeus, não cabe a estes descrever o que se passa nas suas sociedades e o que se passa nas outras sociedades, é bom que cada sociedade elabore a sua visão para uma melhor compreensão mútua.

A discussão sobre este Museu das Descobertas que ficou para as calendas foi muito agitada, apenas alinhei estes poucos argumentos por causa da palavra “Descobertas” e este post do Vítor que tenho vindo a referir indicou-me um post com um registo muito equilibrado duma grega (Maria Vlachou) que vive por cá:
Retive as sugestões:
- que as actividades marítimas das Descobertas podiam/deviam ser  tratadas no Museu da Marinha com o destaque devido;
- que para fazer um Museu é preciso dotá-lo de alguns meios para funcionar bem;
- que antes do edificio se devia definir o conteúdo do museu.

Termino com a imagem da capa do livro os Descobridores, de Daniel J. Boorstin, historiador da univeridade de Chicago e director da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos da América de 1975 a 1987. O livro foi publicado na América em 1983 e numa versão em Português, pela Gradiva em 1987.

No Prefácio à edição portuguesa de The Discoverers D.J. Boorstin escreveu:
«
Nada me agradaria mais do que ver aparecer The Discoverers em português- a língua de Camões e dos pioneiros dos descobrimentos do Ocidente. É também espantosamente apropriado que este pequeno símbolo de agradecimentoe reconhecimento possa ser mandado do Novo Mundo, que teria sido com certeza um lugar muito diferente e muito menos interessante se não tivessem sido a imaginação, a  coragem e o espírito de aventura dos Portugueses na época dos descobrimentos. Os descobridores portugueses ainda não tiveram o reconhecimento e as celebrações que  merecem no Ocidente de língua inglesa.
...
»



A figura da capa é a gravura Flamarion uma metáfora de um homem descobrindo o que está para além das imagens quotidianas.

2018-11-20

As touradas revisitadas


Em Outubro de 2010, na sequência da proibição de touradas na Catalunha em Julho desse ano, assinei uma petição para proibir touradas em Portugal, fazendo então um post sobre o tema, incluindo considerações sobre os Jain da Índia e sobre a morte cruel das lagostas .

Fui agora ver se a proibição na Catalunha se mantém e constatei no DN de 20/Out/2016 que o Tribunal Constitucional de Espanha anulou  a proibição de touradas:
«
 O Tribunal Constitucional espanhola anulou o acordo do Parlamento catalão de julho de 2010 que proibia as touradas naquela comunidade autonómica. A sentença afirma que a Catalunha pode regular as festas taurinas e proteger os animais, mas não as pode proibir. Juízes tomaram a decisão com oito votos a favor e três contra.A decisão do Constitucional baseia-se no facto de o Estado espanhol ter declarado a tauromaquia património cultural, pelo que o tribunal considera que a proibição das touradas invade as competências estatais. Em 2013 e 2015 o governo do Partido Popular (PP) aprovou duas leis (contestadas na altura até ao Constitucional) que consideram a festa taurina património cultural imaterial.A decisão do Parlamento catalão de 28 de julho de 2010 a proibir as touradas entrou em vigor a 1 de janeiro de 2012. Mas a sentença do Constitucional vem agora devolver as touradas à Catalunha.
»

O mesmo DN informou em 21/Out/2016 que a Catalunha vai ignorar o fim da proibição das touradas, usando regulamentos que impedem o mau trato dos animais.

Tenho dúvidas se se trata de uma questão civilizacional, se cultural, se de uma tradição de exibição de coragem e destreza envolvendo o tratamento cruel de animais. No caso da Catalunha é provável que a proibição fosse também uma forma de essa região autónoma se distanciar duma tradição com grande força em Espanha. Constatei que a votação do parlamento catalão que proibiu as touradas foi bastante divisiva, 68 a favor, 55 contra e 9 abstenções, em que o apoio da proibição coincidiu praticamente com os  partidos separatistas.

Dadas as paixões que o tema provoca considero que, uma vez que continuamos a comer bifes de gado vacum, uma eventual proibição de touradas em Portugal só faria sentido quando uma maioria considerável da Assembleia da República apoiasse a abolição.

Entretanto não vejo razão para dar isenções fiscais totais ou parciais (aquilo que o Estado designa incorrectamente por "benefícios" fiscais) a este tipo de espectáculo.


2018-11-19

A audiência do meu blogue


O meu blogue tem alguns leitores, quando não aviso ninguém talvez apareçam no primeiro dia de um post uns 10 visitantes e esse número vai aumentando lentamente com o passar do tempo. Quando um post me deu mais trabalho e me parece jeitoso às vezes envio um e-mail a antigos colegas e mais talvez uma dezena de pessoas seleccionadas a avisar da sua existência. Nesse caso no primeiro dia talvez tenha umas 20 visitas. Tenho interesse em ter leitores mas não que sejam em demasia porque nessa altura aparecem os chatos, os trolls, etc ou então será porque os posts não prestam sendo verdes.

Recentemente publiquei este post: https://imagenscomtexto.blogspot.com/2018/11/uma-experiencia-agradavel.html em que a proprietária nele referida (que avisei) deve ter posto o respectivo link no facebook dela e no primeiro dia tive mais de 1000 visitantes. No 2º dia muito menos e agora deve estabilizar com umas 2300 e tal visitas a esse post.

Mostro a seguir a estatística fornecida pelo blogger faz de 7 dias contendo o post referido





e uma versão editada dessa estatística mostrando a informação mais relevante



Em períodos semanais (7 dias móveis) normais o post mais visitado costuma ser um muito antigo, de 2008, com o título "Caligrafia", costuma ter à volta de 200 visitas semanais, os restantes vão variando mas precisam normalmente de mais do que uma semana para terem um total (desde a criação e não na semana corrente) maior do que 100. As "pageviews aqui mostradas não são o total desde o início do blogue mas apenas as visitas de 7 dias (de 11-18/Nov/2018).


O poder do facebook é realmente impressionante, continuo não interessado em ter conta lá.

2018-11-17

Outono em Lisboa


Não negando as alterações climáticas que se têm  vindo a manifestar e que requerem uma descarbonização rápida da economia constata-se que não "está tudo mudado".

Tivemos um Verão que chegou atrasado, o mês de Julho foi frescote, mas depois tivemos Agosto,  Setembro e Outubro bastante quentes. Parece ser como nos voos dos aviões, os atrasos do início do dia propagam-se para a parte da tarde. Tivemos umas chuvinhas e uma tempestade grande em Outubro, o Outono está aí e até tivemos o Verão de S.Martinho que agora se extinguiu.

Ontem de manhã tirei esta foto no Jardim Amália Rodrigues à única árvore coberta de folhas amarelas (ouro sobre azul do céu) e cobreadas nesta zona. As folhas de muitas árvores em Lisboa perduram até finais de Fevereiro, quando estão quase a despontar os primeiros rebentos da Primavera.




2018-11-13

Uma Experiência Agradável


Em Fevereiro de 2018 reservei uma semana de Agosto nesta Vivenda Jardim Mar Algarve Porches para passar férias em conjunto com filhos e netos.



Já conhecia o aldeamento e a praia da Nossa Senhora da Rocha protegida por falésia, que costumávamos visitar quando nos fartávamos do vento de sudoeste, tão frequente e forte durante o Verão em praias do Algarve a Leste de Lagos que não estejam protegidas como esta.

Visitámos a casa ainda em Fevereiro, numa deslocação que tivemos que fazer ao Algarve para outros assuntos, e gostámos quer da casa quer do ambiente do aldeamento.

Entretanto em Junho tornou-se difícil passar as férias em conjunto com toda a família e contactei a proprietária para avaliar a possibilidade de reaver parte da reserva que fizera em Fevereiro, mesmo sabendo que sob um ponto de vista contratual não teria direito a qualquer devolução.

A proprietária mostrou grande compreensão com a minha situação, disse-me que iria tentar alugar a casa a outras pessoas, telefonou-me posteriormente a dizer que conseguira e, à parte uma pequena importância para o Booking.com, devolveu-me a totalidade do valor da reserva que eu pagara.

É consolador constatar que a sociedade em que vivemos não é só a selva de desgraças preferentemente descrita nos meios de comunicação social.

Em e-mails que troquei com a proprietária tomei conhecimento que também aluga uma casa situada na região de Viseu, acessível através do Facebook: https://www.facebook.com/acasadaceleste/posts/1970280636588400:




2018-11-05

Da Mobília até Claire Bretécher (continuação e fim)


Os leitores mais atentos terão reparado que o conjunto de sofás Mah-Jong, ícone do fabricante RocheBobois que apresentei no post anterior, são uma ruptura radical com a forma tradicional de estar numa sala ocidental. Por exemplo, os meus pais não se sentiriam à vontade numa sala com sofás Mah-Jong.

Talvez também por isso o fabricante francês “Ligne Roset” lançou em 1973 a linha de sofás “Togo”, desenhada por Michel Ducaroy, que comemorou o 40º aniversário em 2013, continuando também actualmente em produção



Os assentos são mais altos do que os Mah Jong mas mais baixos do que o que era normal nos anos 70. As pessoas mais idosas têm por vezes dificuldade em se levantar destes sofás, o que não acontece para quem está habituado a sentar-se no chão com as pernas cruzadas. Estes sofás suportam as pessoas confortavelmante em várias posições, desde as costas quase verticais, com a cabeça bem afastada do topo do sofá, até posições em que a cabeça se apoia nesse topo. É esse tipo de posição que é apresentado, com algum exagero, nesta outra capa de “Les Frustrés” de Claire Bretécher


Na comemoração dos 40 anos em 2013 vi numa loja fora de Portugal esta variante dos sofás originais



em que me interroguei para que serviriam as almofadas num sofá já por si tão confortável. E fiquei na dúvida se com um sofá destes na sala faria sentido ter na mesma casa um quarto de dormir.

Para finalizar mostro outro sketch da Claire Bretécher com as protagonistas sentadas descontraidamente num sofá mais parecido com esta linha Togo



2018-11-03

Da Mobília até Claire Bretécher



Nos anos 60 do século XX ocorreu uma importante revolta da juventude contra os valores tradicionais das sociedades do mundo ocidental, designadamente a moral familiar tradicional, o militarismo e as hierarquias, a sociedade de consumo, o sistema capitalista. Nos E.U.A. incluiu a contestação da guerra do Vietnam e o apoio pelos direitos civis e contra o racismo. Na Europa ocorreu o Maio de 68 nas universidades de França e muita agitação estudantil na Alemanha. No mundo ocidental ocorreu uma revolução na música popular, basicamente iniciada pelos Beatles e acompanhada por uma explosão de novos talentos que se exprimiram em muitos festivais como o de Woodstock em 1969 e outro na ilha de Wight de que se destacou o de 1970. Em Portugal tivemos o festival de Vilar de Mouros em 1965, uma crise académica em Lisboa em 1962, outra em Coimbra em 1969 e o 25 de Abril em 1974.

O movimento hippie de não violência procurou uma vida mais simples, mais próxima da natureza, indo buscar inspiração no budismo e no induísmo. As viagens de muitos jovens ocidentais ao Extremo Oriente, por exemplo os Beatles e o Steve Jobs futuro CEO da Apple, sobretudo à Índia e ao Nepal devem ter tido influência no desenho do mobiliário no Ocidente.

Mostrei num post recente uma casa japonesa tradicional


onde se constata que as pessoas se sentam ou ajoelham sobre o Tatami e as mesas (Chabudai) quando existem são extremamente baixas, costumavam ter 15 a 24 cm de altura atingindo actualmente 30cm.

Certamente foi esta influência do Extremo Oriente e uma vontade de romper com a mobília tradicional do Ocidente que levou o fabricante francês RocheBobois a lançar em 1971 a linha Mah Jong (homónimo de um jogo chinês, em voga em Portugal talvez nos anos 1950):



Esta linha de mobiliário que comemorou 40 anos em 2011 e fará 50 em 2021, continua a ser fabricada, no início tinha tecidos monocromáticos, actualmente é também decorada por vários designers, no site da RocheBobois referem Kenzo Takada, Missoni Home e Jean Paul Gaultier


Tomei contacto com a obra da Claire Bretécher, onde desenhava uma personagem chamada “Cellulite” na revista Pilote que referi em vários posts neste blogue. Posteriormente esta autora colaborou na revista “Nouvel Observateur” onde assinava a série “Les frustrés” gozando com os comportamentos da esquerda burguesa intelectual. Essa burguesia usava este tipo de mobiliário, como se pode constatar parcialmente nesta capa


e também neste neste sketch duma mulher chorando o seu ex-amor



É um humor algo ácido, a autora confirma alguma misantropia nesta entrevista de 2009:
- Vous êtes misanthrope ?
- Raisonnablement. Par périodes. 

 
(Continua)