2024-04-29

Descolonizar África



O 25/Abril/1974 em Portugal teve como uma das suas causas principais a guerra colonial que se eternizava sem solução política à vista.

Pensei em documentar o contexto da nossa descolonização em relação ao que se passava no continente africano e comecei por consultar esta “Lista de países por data de independência ou criação” da Wikipédia que refere sobre esta entrada: “Texto necessita de revisão, devido a inconsistências e/ou dados de confiabilidade duvidosa.”

Tendo em atenção que estabelecer a data em que um pais ficou independente é um assunto normalmente controverso, considerei contudo que no caso da descolonização da África, em que os países africanos decidiram não alterar as fronteiras coloniais, seria mais simples tomar como referência a data de saída da potência colonial.

Fiz uma lista copiando a tabela desse artigo da Wikipédia relativa a África, dado que por sorte a informação está organizada por Continente. Para simplificar considerei “datas de independência” ocorridas apenas depois da guerra de 1939-45 e seguindo este critério simplista apenas 5 países em África (Marrocos, Egipto, Libéria, Etiópia e África do Sul) não eram colónias de países Europeus e mesmo assim alguns deles ainda eram protectorados.

Segundo a lista, entre 1951 e 2011 ficaram independentes 49 países africanos, a Líbia em 1951, o Sudão e a Tunísia em 1956, o Gana em 1957, a Rep.Centro-Africana e a Guiné(Conakry) em 1958 e depois 17 países em 1960!
 



Os países têm populações muito diferentes pelo que me pareceu prudente calcular para cada ano qual a percentagem de população africana que nesse ano passou a viver num país independente, obtendo o gráfico seguinte
 


Constata-se neste gráfico que a descolonização de África se concentrou fortemente no ano de 1960 a que se somaram mais algumas significativas até 1964. A partir daí não houve contribuições relevantes até ao ano de 1975, em que ficaram independentes Moçambique e Angola.

Embora eu tivesse a noção clara que os governantes de Portugal estavam "orgulhosamente sós", eu limitava-me a estar "desconfortavelmente só" pois não via diferença que justificasse a posição portuguesa. Contudo fiquei agora surpreendido com a brevidade do período em que a descolonização das outras potências coloniais foi feita e poderia até ironizar com a demora da decisão sobre a localização do aeroporto de Lisboa. Se neste caso mais simples temos demorado tanto tempo como se poderia esperar que descolonizássemos depressa?

Depois das colónias alemãs terem sido repartidas entre a Inglaterra e a França (e a África do Sul que ficou com a Namíbia) após a guerra de 1914-18 a decisão da Inglaterra, França e Bélgica descolonizarem as suas colónias em África e a preparação dos processos entre 1945 e 1960 foi relativamente breve. Nesse ano em que a França descolonizou tudo à excepção do Burkina Faso que se atrasou para 1962 e a Inglaterra descolonizou a Nigéria, país densamente povoado, aproximadamente equivalente a todas as colónias francesas, descolonizaram-se mais de metade da população africana que iria ser descolonizada. Nos 4 anos seguintes a Bélgica abandonou o Congo e a Inglaterra descolonizou a África Oriental.

O facto de os Portugueses serem descendentes dos primeiros europeus que aportaram a terras africanas então desconhecidas da Europa não era razão suficiente para manter eternamente uma dominação do governo de Lisboa sobre aquelas terras distantes que tinham que ser periodicamente “pacificadas”. Os incidentes que ocorreram em Angola em 1961 certamente que foram influenciados pela descolonização maciça ocorrida em África no ano de 1960, seguidos depois na Guiné e em Moçambique, constatando a posição imóvel do governo de Portugal.

Considerando que nos 5 países africanos, já independentes em 1950 e acima referidos, viviam 24,3% dos habitantes de África, elaborei o gráfico seguinte em que mostro em cada ano a percentagem acumulada dos habitantes de África em países descolonizados

 


Entre 1965 e 1974 o valor acumulado passou apenas de 91,8% para 92,6% tendo passado em 1975 para 97,4%, devido a Angola e Moçambique. Após esse ano ficaram independentes o Zimbabwe em 1980, a Namíbia em 1990, a Eritreia em 1993 e o Sudão do Sul em 2011.

A única parcela de África com uma situação juridicamente indefinida é o Sara Ocidental, uma zona sob administração espanhola de onde saíram as autoridades de Espanha em 1976 tendo Marrocos ocupado imediatamente o território que é adjacente ao seu e muito pouco povoado. A situação está pendente na ONU.

Nota: como seria bastante difícil averiguar individualmente a população de cada país quando se tornou independente acabei por usar não os habitantes à data da independência mas o número de habitantes no ano de 2016 que fora buscar a ( https://www.worldometers.info/ ) em 2016 e que presumo ser relativamente parecido ao actual.

Para ilustrar a sequência de países descolonizados fiz uma apresentação em PowerPoint em que a partir dum mapa político de África com todos os países a cinzento, excepto os cinco já  independentes em 1950, fui colorimdo os que iam sendo descolonizados, com uma lista no canto inferior esquerdo e o ano da descolonização donde saíam rectas até aos países descolonizados nesse ano no canto superior direito.

No penúltimo mapa ficou a cinzento apenas o Sara Ocidental. No final apresento um mapa com os nomes dos países. Converti o “Slide Show” num ficheiro mp4 que mostro a seguir.




Talvez reparem que precisei de mais do que as quatro cores que a Conjectura de Fermat referia como número suficiente para cobrir qualquer mapa. Isso resultou de ter colorido cada país na sequência da sua descolonização em vez de fazer uma escolha prévia das cores para minimizar o número de cores necessárias.

A seguir mostro uma das possíveis soluções usando apenas 4 cores.

 
Depois disto tudo descobri esta imagem .gif que tem apenas 16kB e que mostra a sequência das independências de forma mais compacta em Descolonizacão
 


3 comentários:

Anónimo disse...

Post interessante e informativo. Realmente, o antigo regime cometeu um enorme erro ao não descolonizar ao mesmo tempo que a larga maioria dos outros países Europeus, o que nos custou uma guerra em que morreu ou ficou afetada muita gente de ambos os lados. Uma guerra desse tipo era insustentável, o que acabou por ficar provado. Essa guerra provocou também uma desconfiança entre as antigas colónias e Portugal que durará bastante tempo e que tem consequências práticas. Agora, isso é sinal de uma proverbial falta de rapidez de decisão em Portugal? Acho que, neste caso, as causas são mais profundas e têm a ver com a própria lógica da por vezes chamada II República. Agora, para decisões mais prosaicas como Alqueva, o novo aeroporto de Lisboa, etc, sim, é verdade e resulta da alargada incompetência da nossa admistração pública e de muitos interesses, legítimos ou não, que conseguem contrariar durante décadas a tomada de decisão, sobretudo de grandes obras. É por essas e por outras parecidas que o País progride menos que o que seria necessário. Infelizmente, não tenho grande esperança que as coisas mudem rapidamente.

Luís Lucena disse...

É muito interessante a análise exaustiva, e bem documentada, do que foi o processo da descolonização em África, por parte das potências europeias, a seguir à segunda guerra. Quando acabei de a ler, pensei que seria um bom complemento uma análise da evolução, política e económica, dos novos países que obtiveram a independência.
Concordo inteiramente com os comentários do "anónimo". Não gosto de ser pessimista, mas a verdade é que uma das nossa características é gostarmos muito de fazer estudos, gastando tempo e dinheiro, mas temos muita dificuldade (medo?) em decidir

Ferreira de Almeida disse...

Parabéns um bom trabalho com bastante mérito.
Decidir seja o que for implica sempre alguma responsabilidade. Alguém dizia que era preferível alguém decidir por nós, muito mais fácil é criticar.
De um modo geral, estou convencido que as populações desses estados não melhoraram significativamente as suas vidas, mas os seus novos governastes ficaram muito melhor de vida e as empresas que por lá exploram as suas riquezas passaram a poder faze-lo à vontade sem serem acusadas de imperialistas e muito menos colonizadores desenfreados.
Os seus governantes permitem tudo desde que tenham boas contrapartidas pessoais...este é o quadro dos dias de hoje. Nova forma de explorar os já explorados, sem problemas de consciência.