2020-09-29

Desastres



Costumo ver o programa GPS (Global Public Square) do jornalisa da CNN Fareed Zakaria que costuma passar aos sábados das 20:00 às 21:00 na RTP3. Trata-se de um programa de informação em que o jornalista entrevista alguns notáveis sobre 3 ou 4 temas da actualidade semanal.

No último programa um dos temas era sobre os fogos na Califórnia onde mostrou esta imagem


que fui depois tentar localizar na internet e que encontrei neste sítio australiano

No artigo referem que esta foto levou muitas pessoas a pensar que se tratava da ponte Golden Gate de São Francisco o que significaria que esta cidade estaria a arder. A confusão foi facilitada por imagens de um nevoeiro cor-de-laranja que efectivamente rodeou essa ponte. No artigo esclarecem que se trata da “Bidwell Bar Bridge” em Oroville que fica a cerca de 300km dessa cidade.

Procurando no google cheguei a esta imagem da ponte num dia sem incêndios


onde se constata a arborização da encosta e a ausência da casas nessa encosta, embora no Google Maps se note que perto desta ponte existe uma marina, com muitas “casas-barco” estacionadas na água, junto a uma encosta com muitas casas.


  
A ponte era uma das mais altas na altura da sua construção concluída em 1966, pois liga duas encostas separadas por um vale profundo, que foi inundado pela albufeira criada pela barragem de Oroville. Neste sítio  tem uma pequena descrição e além da foto acima mais um conjunto de fotografias da ponte muito interessantes.

A barragem de Oroville foi concluída em 1968 e a albufeira tem uma capacidade máxima de 4300hm3 (4.3 trillion litres). Como comparação refiro que a albuteira de Castelo do Bode tem uma capacidade total de 1095 hm3 e a de Alqueva de 4150 hm3. A potência eléctrica instalada é de 819MW (3x273MW), com bombagem, muito mais do que os cerca de 3x50MW de Castelo do Bode ou mesmo os actuais 520MW de Alqueva, estes últimos usados principalmente em ciclo geração/bombagem para tirar partido das diferenças de preço da energia eléctrica nas diversas horas do mercado grossista.

Uma foto do canal do descarregador de cheias no final de Fev/2017



levou-me a visitar mais este artigo da Wikipédia sobre a crise da barragem de Oroville em Fev/2017  .

Uma recomendação de reparação do canal do descarregador de cheias da barragem em 2005 orçada em 100 milhões de US$ foi ignorada até aos enormes danos de Fev/2017 que exigiram um gasto superior a 500 milhões de US$.

Este desastre criou a oportunidade de em 2017 aumentar o produto nacional bruto dos EUA em 500 milhões de USD enquanto a reparação atempada em 2005 permitiria um aumento do produto apenas de 100 milhões. Alguns economistas não estarão satisfeitos com este critério de cálculo do produto mas, como dizem alguns, é difícil encontrar alternativas.
 


2020-09-28

2020-09-24

Obituário gráfico de Ruth Bader Ginsburg

 

A próxima capa da revista "The New Yorker" é esta magnífica ilustração de Bob Staake, evocando um colar de renda de "crochet", usado pela juíza Ruth Bader Ginsberg do Supremo Tribumal dos EUA, composto por símbolos do sexo feminino, um círculo com uma cruz.

Existe um artigo na Wikipédia em Português sobre esta juíza bastante extenso e foram publicados recentemente inúmeros obituários.

Mostro a seguir duas fotos da juíza usando o colar de renda de crochet que inspirou a capa da revista.



2020-09-23

Michael Sandel Justice: What's The Right Thing To Do?

 

Vi em Julho/2012 uma referência do Pedro Mexia no Expresso ao curso do Michael Sandel sobre Justiça e fui dar a este sítio da Universidade de Harvard sobre Michael Sandel

No mesmo sítio têm ligações para cada uma das 24 lições (Lectures) do curso referido e na altura gostei imenso da primeira lição.

Provavelmente pensei que faria um post quando tivesse visto o curso completo mas após ver mais algumas lições acabei por não chegar ao fim do curso nem escrever o post.

Há dias vi na  “The New Yorker” este artigo do Evan Osnos intitulado “A Political Philosopher on Why Democrats Should Think Differently About Merit” em que Michael Sandel defende que a adesão do partido Democrata à meritocracia o afastou de compromissos com o bem comum e com a dignidade de todo o trabalho. Diz ainda que para que Joe Biden ganhe a próxima eleição presidencial dos EUA, não basta descobrir os defeitos de Donald Trump como presidente dos EUA, é necessário descobrir porque é que tanta gente tenciona votar nele e tomar acções para mudar esses votos.

No Youtube encontrei este video de 9 minutos “The Tiranny of Merit”

 

em que considera necessárias 3 mudanças:
- No papel da Universidade;
- Na dignidade do trabalho;
- No significado do sucesso.

 

Gostei também deste TED talk de 15 minutos ” Why we shouldn't trust markets with our civic life“




Deixo ainda um Youtube com as duas primeiras lições do curso de Harvard, “The Moral Side of Murder” e “The Case for Cannibalism”



As restantes lições podem ser acedidas aqui.
 


2020-09-12

Anna Koote: Porque precisamos de reduzir a semana de trabalho


Depois duma longa vilegiatura de cerca de dois meses e meio no Algarve, agora tornada possível devido à minha condição de reformado, na companhia de netos, filhos e praia, regressei a Lisboa onde tenho um acesso melhor à Internet.

Este blogue tem tido poucos posts, sobretudo nos meses de Julho e Agosto, mas certamente que os leitores habituais encontraram outras leituras e/ou outras actividades para preencherem o seu tempo.

Desde que me registei na revista “The Architectural Review” recebo de vez em quando uns e-mails. Desta vez dei uma vista de olhos pelo conteúdo, existindo um artigo intitulado “Why we all need a shorter working week”, de Anna Koote, publicado em 24/Fev/2014 com esta imagem como chamariz


Lembrava-me desta imagem dum escritório com uma floresta de colunas mas já me esquecera do arquitecto. Com o “Google Images“ foi fácil recordar tratar-se de obra de Frank Lloyd Wright, em 1939, para a sede da empresa Johnson Wax.

Esta “Taylorização” do espaço do  escritório costuma recordar-me a visita que um personagem da trilogia da “Fundação”, obra de ficção científica de Isaac Asimov, fez ao planeta Trantor, sede do império galáctico em decadência acelerada. Aqui ainda se vêem os limites do escritório. Em Trantor, um planeta completamente urbanizado, os escritórios estendiam-se até à linha do horizonte, sem um limite visível.

A identificação da imagem constava nesta página referindo o projecto para os escritórios da firma “Goodby Silverstein” feito pela firma “Jensen Architects”. Nela também mostravam estoutro escritório do filme “Playtime” do Jacques Tati que, à semelhança do Gotlib, tinha um humor “gelado e sofisticado” 


Mas regressando ao artigo “Why we all need a shorter working week”, optei por transcrever algumas das suas frases, que merece contudo uma leitura completa

«
...To unleash the full economic, environmental and creative potential of society, Anna Coote argues we must escape the treadmill
...
Accordingly, we must strive to be more ‘productive’ by producing as many things as possible in the shortest possible span of time. But as the economist Tim Jackson has crisply pointed out, playing a symphony twice as fast as usual doesn’t make it more efficient, just a lot worse. Likewise, you can’t become a more productive carer, teacher, nurse, brain surgeon, architect or road-crossing attendant by doing your work at double speed.
...
Another reason is that more and more people are aware of being caught in a profound and prolonged crisis: we have a global economy that is damned if it grows (because of the likely negative impact on climate change) and damned if it doesn’t grow (because of the likely negative impact on jobs and income). Crisis provides a strong incentive to think afresh and seek out alternatives.
...
And we must make the transition gradually, with incremental changes that help to build popular support. There’s a wide variety of policies adopted by different countries for reducing working hours. The Netherlands, Belgium, Denmark and Germany, have considerably shorter average hours than the UK. Their economies are just as strong, or stronger. Drawing on their experience and on other ideas put forward in Time on Our Side, here are three good ways to make a start.
...
Will any of this ever happen? Today’s utopian dream is often tomorrow’s normal way of life. Think of ending the slave trade, votes for women, seatbelts, smoking bans. We used to put children up chimneys. Women used to be sacked when they got married. We used to expect workers to put in 12-hour days for six days a week. Change will come – in time.

»

De vez em quando tenho abordado esta temática da redução do horário de trabalho, designadamente nestes posts:

2017-12-23 Trabalhar muito menos 

2012-08-10 O Fim do trabalho  

2011-04-23 Produtividade, horas de trabalho e feriados 


2020-09-01

O Lar de Reguengos de Monsaraz



Na sequência das numerosas referências à entrevista dada por Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, publicada na edição de 15/Ago/2020 do jornal Expresso fui ler essa parte do jornal.

Fiquei com boa impressão da ministra, que me pareceu bem focada na área de actuação que compete a quem lidera um ministério, delegando nos serviços deste organismo a primeira leitura dos certamente numerosos relatórios que vão chegando.

Pareceu-me na leitura que os jornalistas insistiam demasiado na tecla do relatório elaborado pela Ordem dos Médicos sobre o lar de Reguengos de Monsaraz. Frequentemente os jornalistas valorizam de forma excessiva a qualidade da informação elaborada por entidades alegadamente “independentes”, como se as instituições fossem sistematicamente suspeitas de esconder informação e os alegadamente “independentes” sejam dignos de todo o crédito desde que exteriores a uma instituição existente.

Há muito tempo que se fala dos problemas nos lares de idosos, onde se constataram graves surtos de COVID-19, quer em Portugal quer noutros países, por neles viverem comunidades numerosas onde portanto as possibilidades de contrair doenças infecciosas são maiores do que em casas unifamiliares e se tratarem de pessoas especialmente vulneráveis à COVID19. Considerando que existem 2500 lares de idosos em Portugal, o número de surtos de 369 em Abril/2020 afectou portanto 15% do total enquanto na altura da entrevista em Agosto existiam 69 surtos o que corresponde a 3%.

No dia 1/Set o jornal Público noticia a existência de um surto com 16 mortos num lar de luxo no Porto.

Se no caso de Reguengos foi noticiado que parte apreciável dos profissionais do lar deixaram de comparecer ao serviço, quer por doença quer por demissão, ao ponto de ter sido necessária a intervenção das Forças Armadas para redistribuir alguns dos utentes por outros lares e/ou hospitais, mostrando também as consequências da falta de formação dos profissionais desse lar, problema que será transversal a um país com baixa escolaridade e formação profissional, este lar do Porto mostra que mesmo em lares com boas condições uma brecha nas barreiras contra  o vírus pode mesmo assim ter consequências desastrosas.

Do que foi noticiado em relação a Reguengos parece-me um pouco estranho o interesse da Ordem dos Médicos na elaboração de um relatório sobre o que se  passou no lar de Reguengos. Os desvios em relação às boas práticas aconselhadas e eventualmente obrigatórias eram tão patentes que não me parecia útil qualquer investigação adicional por parte de uma associação de médicos. Entre Reguengos e o lar do Porto uma investigação médica sobre o que falhou no Porto parecer-me-ia à partida mais promissora embora isto não seja uma recomendação para fazer uma.

Já citei neste blogue algumas críticas á forma como os media gerem as notícias que escolhem para destaque, como por exemplo aqui e aqui.

Desta vez cito um artigo aparecido na revista Forbes “Why the world is getting better and why hardly anyone knows it” de que destaco:

«…
Our World In Data suggests that the media are partly to blame. The media does not tell us how the world is changing, it tells us where the world is going wrong. It tends to focus on single events particularly single events that have gone bad. By contrast, positive developments happen slowly with no particular event to promote in a headline. “More people are healthy today than yesterday,” just doesn’t cut it.
…»

Gostei dum comentário no Expresso do Sérgio Sousa Pinto em que destaca as condições economicamente difíceis em que operam muitos dos lares para idosos, pouca verba disponível para fornecer serviços de qualidade aos utentes e gostei também do comentário "A guerra corporativa de Reguengos" noutra edição do mesmo jornal do Daniel Oliveira sobre o papel que o Serviço Nacional de Saúde deverá ter no apoio a lares de idosos, papel esse que não está ainda bem definido.

O artigo do José Gameiro na Revista do Expresso de 29/Agosto "Os médicos são intocáveis?" também me pareceu equilibrado. Embora compreenda a censura que ele faz a António Costa de não ter designado o bastonário da Ordem dos Médicos como o destinatário da alusão que “era mais fácil fazer críticas ao governo na TV do que tratar doentes” acho que a esmagadora maioria percebeu quem era o destinatário. Lembrei-me dos tempos do  pós-25 de Abril em que as pessoas se referiam ao PCP como “um determinado partido”. Não sei se seria para evitar problemas judiciais e se é esse o caso desta vez.