Quando eu era muito jovem o meu pai comprava-nos livros da colecção Formiguinha e depois da leitura exigia-nos que lhe contássemos a história que acabáramos de ler com as nossas próprias palavras.
Ficou-me daí um pequeno trauma de infância relacionado com a palavra “depois”. Era uma palavra difícil de evitar, na ligação entre os diversos episódios do livro, por vezes o “e depois” podia ser substituído por o “e então”, mas à mais pequena distracção havia sempre um “e depois” que se inseria sorrateirament no discurso.
Não sei se é por esse hábito que neste blogue vou falando dos poucos livros que vou lendo, presumo que deve haver alguma ligação
Neste caso trata-se dum livro do Alain de Botton, filósofo que nasceu na Suíça, que vive em Inglaterra e que tem tido enorme sucesso nos livros que publica e nos programas para a televisão que tem feito.
Claro que com tanto sucesso seria praticamente inevitavel que o viessem classificar como escritor pouco profundo, que dará uma ideia completamente errada dos temas que trata, etc.
Eu não cheguei a ver na íntegra os programas que passaram na TV, nessa altura não havia a facilidade das gravações automáticas mas uma vez que o ouvi falar sobre religião apreciei a interpretação que deu do pecado original e que referi aqui.
Neste livro concordei com a maior parte das observações, faz-me contudo impressão que os defeitos por ele apontados e que são tão numerosos não tenham sido eliminados há muito tempo. A persistência do que parecem ser defeitos gritantes nos meios de comunicação social deve ter raízes mais profundas do que as expostas no livro, caso contrário já teriam desaparecido. De qualquer forma o livro está cheio de recomendações que parecem boas
Os títulos dos capítulos são Prefácio, Política, Notícias do mundo, Economia, Celebridade, Catástrofe, Consumo e Conclusão.
Passo a citar algumas passagens soltas do livro:
“… as notícias deviam ajudar-nos … a reconciliar-nos com a dificuldade que consiste em sermos capazes de imaginar a perfeição ao mesmo tempo que não somos capazes a garantir – por uma série de razões estúpidas mas inamovíveis”
Claro que o autor refere a predominância das notícias negativas sobre as positivas. Embora estejamos agora no meio de uma crise considerável, o país melhorou imenso desde o 25 de Abril de 1974. No entanto, durante todo esse período de grandes melhorias não se passou um ano em que não predominasse a opinião que caminhávamos a grande velocidade para a nossa ruína.
Esta citação
“Uma gaffe jornalística é qualquer coisa que uma pessoa importante inadvertidamente diz ou faz num momento de distracção – e que (como toda a gente sabe) de modo nenhum reflecte as suas ponderadas opiniões – e à qual os noticiários se aferram, e se recusam a larger, insistindo em que a gaffe é forçosamenteum indicador de uma profunda e vergonhosa verdade”
fez-me lembrar o vergonhoso episódio que se passou com António Guterres quando, após lhe comunicarem que a mulher tinha um cancro no fígado, foi dar uma conferência de imprensa em que se enganou num cálculo mental. A população em geral e os jornalistas em especial teceram considerações idiotas sobre as suas fracas capacidades, criticando com displicência um aluno e politico brilhante!
O autor aponta ainda a confusão entre o que é novo e o que é importante: “O ritmo do ciclo noticioso é implacável. Por muito momentosos que sejam as notícias de ontem – os deslizamentos de terras, a descoberta do corpo meio-escondido de uma rapariga, a humilhação de um politico outrora poderoso-, cada manhã toda a cacofonia começa de fresco.”
No livro tem uma fotografia do autor num bosque de bétulas que mostro ao lado, foi uma coincidência curiosa eu ter mostrado um quadro do Klimt sobre um bosque de bétulas no post anterior
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