2019-11-06

A energia em Portugal, por Jorge Vasconcelos



Em Janeiro de 2019 saiu este volume da colecção”Ensaios da Fundação”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Até agora tenho gostado de todos os livros desta colecção que tenho comprado e referido neste blogue e este não foi excepção. A Fundação escolhe bem os ensaístas e eu tenho comprado livros de autores de quem à partida tenho boa impressão. Gosto de ler textos escritos por pessoas que conhecem os assuntos de que estão a falar, e o Engº Jorge Vasconcelos é uma das pessoas muito bem preparadas para falar sobre a energia em Portugal.

O formato físico destes ensaios dá a oportunidade de abordarem um determinado tema com mais profundidade do que com uma série de tweets mas com um dimensão de cento e poucas páginas que ajudam ao foco no essencial.

Gostei muito da enumeração das dificuldades com que se depara um estudioso destas matérias, com a variedade de medidas que são usadas no comércio da energia e a consequente complexidade e dimensão dos obstáculos que resistem à adopção do SI (Sistema Internacional de Unidades) por todo o mundo. Actualmente os únicos países que ainda resistem à sua adopção são os Estados Unidos da América, a Libéria e Myanmar.

Por exemplo, a fixação de preços num mercado tão importante como o petrolífero ainda recorre ao Barril, uma palavra só por si eloquente sobre a importância relativa que os mercados dão à unidade monetária em que o preço é expresso (US$) comparativamente à unidade em que é expresso o volume (barril) do produto transaccionado.

Gostei da referência à polémica entre Newton e Leibniz sobre o que seria verdadeiramente invariante, se a energia cinética, proporcional à massa vezes o quadrado da velocidade, se a quantidade de movimento, proporcional à massa vezes a velocidade. Esta perspectiva histórica mostra-nos que o que está bem estabelecido no nosso tempo não foi desde logo evidente mas, através do raciocínio, da  discussão e da experimentação se conseguiu convergir num consenso que mesmo assim poderá ser abandonado e/ou completado com novas descobertas.

Li o livro rapidamente e com muito agrado, existirá um ou outro ponto em que não concordo inteiramente com o autor mas o facto de não me lembrar agora desses pontos de discórdia significa que a sua importância não será grande. Talvez merecesse a pena referir que os mercados de electricidade que têm sido implementados não poderiam existir sem a capacidade de transmissão e de processamento de informação que só estiveram disponíveis na última década do séc XX.

Depois de ler o livro fiz uma procura na net e descobri que houvera esta apresentação no El Corte Inglés no dia 13/Jan/2019



O filme da apresentação demora 1 hora e 9 minutos mas, para quem tiver este tempo disponível, vê-se com agrado. Confesso que é raro ver apresentações tão compridas mas neste caso vi com gosto até ao fim. No meu caso vi a apresentação depois de ler o livro mas considero que poderá também ser ao contrário.

Achei graça à manifestação pelo autor do alívio que sentiu por finalmente poder usar alguma ironia no texto deste livro no tratamento de alguns assuntos, pois enquanto teve papéis institucionais importantes em Portugal sempre fora avisado que era muito perigoso usar ironia nas suas comunicações públicas. Notei a presença de algumas afirmações irónicas ao longo do texto que tornaram a leitura mais agradável.

1 comentário:

jj.amarante disse...

O António Blanco enviou-me este comentário por e-mail:
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Caro Amarante,

Agradeço o envio do artigo que fui ler com agrado. Tinha também comprado e lido, ainda que de corrida, o livro do antigo Presidente da Erse, quando esta Entidade era, como nunca deveria deixar de ter sido, dirigida por um Engenheiro Electrotécnico.

Também eu gostei de algumas coisas e de outras nem tanto ou nada.
Saliento à cabeça a satisfação de ver distinguidas as unidades de potência das de energia, assim como da nomenclatura dos n.os grandes, milhões, milhares de milhões e biliões, utilizados segundo a norma europeia e internacional, conforme os múltiplos das potências de de milhão - 10 exp 6 - , bilião ( 10 exp 12 ), trilião ( 10 exp 18 ), etc., ao contrário do que fazem americanos e já também ingleses que arbitrariamente consideram o 10 exp 9, como o bilião, quando para nós será apenas o milhar de milhões, escalão que os franceses designam por nome próprio, o milliard, reservando o bilião para o 10 exp 12, ou milhão de milhões, como a Norma do Bureau des Unités e Mesures determina.
Na parte mais técnica não encontrei divergências significativas, salvo na questão das "alterações climáticas" e da dita "descarbonização da energia", cuja designação ou terminologia logo me irrita, pela sua motivação eminentemente política e não científica ou técnica, área em que a questão se deveria discutir.

A obsessão anti-combustíveis fósseis e a defesa exclusiva do recurso às energias renováveis esconde uma questão fundamental : estarão os seus defensores extremados dispostos a abdicar dos níveis de Qualidade de Serviço actuais - TIE ( tempo de interrupção de serviço ) e ENF ( energia não fornecida ) daquele decorrente ?

Se sim, a opção exclusiva pela energias renováveis será defensável. Caso contrário, cairemos numa contradição insanável...

Isto poderia levar-nos a uma discussão interessante, mas prolongada, preferencialmente sempre no plano técnico, científico. No político, tudo isto sai desvirtuado.

Esta é a minha visão do assunto, de que profissionalmente me ocupei, como sabes, durante décadas.
Grato pela atenção.

Um abraço,
António Blanco

PS : Se quiseres, podes publicar este comentário.
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E o meu comentário:
Seria errado comprometer a qualidade de serviço alegando necessidade de recorrer desde já exclusivamente a energias renováveis. Mas o recurso a energia de fontes fósseis deve ser reduzido sempre que possível, mantendo a qualidade de serviço, até à supressão completa do uso de fontes fósseis.