Quando em 1959 entrei no 1º ano (equivalente ao actual 5º ano de escolaridade) do liceu Camões, no anexo do Areeiro, era obrigatório levar gravata . Toda a sociedade seguia regras muito rígidas, com uma grande obsessão pelo que parecia bem e o que não parecia bem e um respeito enorme pela hierarquia.
“Honrar pai e mãe e outros legítimos superiores” era nessa altura a forma mais comum do quarto mandamento do Decálogo. Na versão actual do compêndio do Catecismo da Igreja Católica o mandamento diz apenas “Honrar pai e mãe”, embora nos comentários se afirme “...Os que estão submetidos à autoridade vejam os superiores como representantes de Deus e colaborem lealmente no bom funcionamento da vida pública e social...”.
(Nota: ao ir verificar o compêndio do Catecismo, julgava ir encontrar um texto expurgado da versão autoritária corrente no tempo do Salazar, não estava à espera deste “...vejam os superiores como representantes de Deus...”.)
Chateavam-me as visitas que se tinham que fazer a familiares, as salas de estar fechadas, reservadas para dias raros e de uma forma geral o ambiente abafado cuja descrição encontrei no Primo Basílio do Eça e que devia ser exacta porque fiquei a detestar esse romance.
Estas sociedades bloqueadas transmitem a ideia que as normas, costumes e relações entre as pessoas são realidades imutáveis, são a forma Natural. Daqui decorre a alegação que as coisas sempre foram assim e sempre hão de ser assim.
Foi com grande entusiasmo que nas aulas de História do 3º ano (actual 7º) tomei contacto com a civilização do Egipto dos faraós. Embora já me tivesse apercebido que alguns adereços comuns no passado, como por exemplo a espada com que costumava andar o D.Afonso Henriques, tivessem caído em desuso, as formas radicalmente diferentes de organização da sociedade egípcia em relação à nossa mostraram-me então claramente que as normas sociais se vão alterando ao longo do tempo.
As imagens deste post são do túmulo da rainha Nofretari (Nefertari em inglês), esposa favorita do faraó Ramsés II, túmulo esse que foi objecto duma exposição em 1979 na Fundação Gulbenkian, onde eram exibidas fotografias na escala 1:1 da totalidade do túmulo, montadas sobre painéis que reproduziam fielmente a forma do túmulo. Pena que esssa exposição não tenha passado a permanente pois seria óptima para ser visitada pelas escolas.
As duas imagens acima obtive-as aqui.
3 comentários:
jj.amarante,
1. Há uma parte do texto que não entendi muito bem: a comparação da sociedade do Egipto antigo com a nossa, para falar de evolução. Ou será que queria comparar o Egipto antigo com o actual?
2. E se fala no D.Afonso Henriques: no meu infantário (um colégio católico, na segunda metade dos anos sessenta) em vez de "polícias e ladrões" brincávamos aos cristãos e aos mouros. Levei muito tempo até me aperceber que aquela história dos cristãos bons e dos mouros maus estava muito mal contada...
Aliás: não ma contaram na escola, apesar do 25 de Abril. Só em finais dos anos 80 é que saiu o livro negro dos descobrimentos, da Ana Barradas.
3. Desviando-me um pouco do tema deste post: uma vez, há quase 20 anos, vi uma exposição sobre o culto dos mortos no antigo Egipto - acho que em Speyer, ou talvez Mannheim. Surpreendeu-me encontrar um imaginário tão próximo do cristão, incluindo até uma referência ao vinho. Infelizmente já me esqueci dos detalhes.
Helena
Enquanto em relação ao passado da história de Portugal uma pessoa mais distraída poderia pensar que os hábitos e costumes tinham mudado pouco ao longo dos séculos (à parte alguns pormenores como as pessoas terem, por exemplo, deixado de andar com espadas...) em relação ao Egipto antigo era impossível não reparar nas enormes diferenças entre o que se passava lá e o que se passava no Portugal contemporâneo. As nossas convenções não tinham existido desde sempre ou em todo o lado.
Adoorei, me ajudou muito. Essa Nofretari devia ser uma das mais belas e mais cultas mulheres do Reino, acho que era por isso que Ramsés II gostava tantoo assim dela. (Y)
=D
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