2025-12-29

A Queda de Ícaro

 

A BBC seleccionou fotografias notáveis feitas em 2025 e associaram outras imagens a cada uma delas.

Gostei desta intitulada "A Queda de Ícaro", 


uma foto tirada pelo astrofotógrafo  Andrew McCarthy a um amigo paraquedista  que fez uma queda livre para proporcionar uma foto dum "Trânsito Solar", mais frequentemente usado para designar a passagem dum planeta interior (Mercúrio ou Vénus) entre o Sol e a Terra ficando o planeta como um círculo escuro contra a imagem do Sol, mas designando também o trânsito de qualquer objecto interposto entre o Sol e a Terra, como por exemplo a Estação Espacial Internacional ou o vaivém Atlantis e neste caso um paraquedista em queda livre.

O texto da BBC refere que é muito difícil obter uma fotografia dum evento deste tipo. Pensei um bocado sobre este assunto, noutros tempos teria impresso a foto e medido o diâmetro aparente do Sol e a altura do paraquedista para obter a razão entre os dois. Agora coloquei a imagem no Powerpoint e coloquei dois segmentos de recta cujo tamanho anotei sobre a figura

 

Sabendo que o diâmetro aparente do SOL é cerca de 32 minutos de grau e que a razão entre este e a altura aparente do paraquedista é 1/16.5 concluímos que o ângulo do homem é 1,94 minutos de grau. 

Considerando a presumida altura real de 2m do paraquedista o ângulo de 1,94 minutos implica que a foto seja tirada à distância de 3549m. A esta distância a imagem do Sol seria como um círculo de 33m, quer dizer, se colocássemos verticalmente um círculo com 33m de diâmetro a 3,5km da máquina fotográfica esse círculo teria o mesmo tamanho que o Sol. A distância de 3,5km parece razoável para as teleobjectivas disponíveis no mercado.

Depois de verificar no AI do Google que: "A velocidade mínima para pequenos aviões varia muito, mas modelos como o Cessna 152 voam a cerca de 79-88 km/h" fiquei a pensar que um paraquedista teria enorme dificuldade em saltar de uma avioneta a 90km/h para "acertar" num "poço virtual vertical" com um diâmetro de 33m.

Antes de declarar como inverosímil que a fotografia fosse tirada de uma queda a partir de uma avioneta lembrei-me que o paraquedista se poderia ter lançado de um helicóptero. O voo para o lançamento seria mais caro do que usando uma avioneta mas acessível para quem se dedica a voos em queda livre.

O astrofotógrafo poderia assim calcular a hora do dia e a localização precisa, latitude, longitude e altitude em que o helicóptero deveria estar no momento do salto. Neste caso poderia até ter uma confirmação visual em Terra da posição do helicóptero. 

Ficava então "apenas" com a captação de um movimento acelerado em direcção à Terra que dizem atingir o seu máximo de 200km/h ao fim de 12 segundos, a que corresponde o valor de 56m/s. A esta velocidade os 33m de diâmetro do Sol acima referidos seriam percorridos em cerca de 0,5 segundos. Seria prudente tentar a foto imediatamente a seguir ao salto do helicóptero em que a velocidade de queda não é tão elevada. Por curiosidade aprendi que com o paraquedas aberto a chegada ao solo se faz a ~20km/h ou 6m/s.

Temos finalmente que esta foto poderia ser tirada numa altura relativamente próxima do nascer do Sol mas segundo a AI do Google: "...a altura mínima para abrir um paraquedas varia, mas em saltos de paraquedismo recreativo (tandem), é comum abrir-se a cerca de 1500 metros...". Provavelmente para uma queda livre sem ser em tandem os valores poderão menores do que os 1500m, mas será necessário dar algum espaço ao paraquedista para abrir o paraquedas depois do instante da foto.

Depois de todas estas considerações parecer-me-ia muito mais simples tirar uma foto do Sol, o que seria fácil para o astrofotógrafo, aproveitar uma dos milhares de fotos de paraquedistas em queda livre transformando uma delas numa silhueta preta e justapô-la à foto do Sol com um programa simples de manipulação de imagens

Mas percebo que para astrofotógrafos e paraquedistas se tratou dum desafio para quebrar a monotonia de algumas tarefas profissionais, tal como esta minha pequena investigação bastante inútil sobre este fenómeno curioso, mesmo a mim que já não tenho tarefas profissionais.

Espero não me ter enganado nas contas, o que costuma acontecer com bastante frequência.

 

Voltando agora à imagem que a BBC associou a esta foto trata-se dum esboço de Peter Paul Rubens (1577-1640, quase coincidindo com a dinastia dos Filipes em Portugal) sobre o Mito de Ícaro, em que um filho não segue os avisos do seu pai com consequências funestas, o pai deve estar a dizer "eu bem te avisei".

No artigo da Wikipédia sobre o mito de Ícaro aparece uma pintura de Jacob Peter Gowy que colaborou com Rubens fazendo, entre outras, uma pintura a partir do esboço de Rubens acima referido.

 

Achei graça a esta variante do mito de Ícaro, da pintora australiana Cynthia Breusche que referi em "Salvando Ícaro":


 

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