Fiquei a pensar porque terei registado esta cena, dum barco antigo em Portimão com o nome “BARCA ARADE” actualmente usado para passeios turísticos até Silves e também para as grutas de Benagil, entre o Carvoeiro e Armação de Pêra.
Julgo que fui atraído pelo reflexo quase perfeito do barco nas águas quase imóveis da ria do Arade e pela forma pouco comum no Algarve da proa do barco, provavelmente terá sido um moliceiro (* ver adenda a este post) que serviu para apanhar algas na ria de Aveiro antes de ter migrado para aqui.
Actualmente existem muitos operadores de circuitos turísticos locais mas quando comprei o meu barco semi-rígido em 1995 havia muito menos e não havia barcos a motor para aluguer.
Há muitos anos tirei um curso de mergulho no CPAS (Centro Português de Actividades Suabaquáticas) mas, à parte os mergulhos desse curso em Sesimbra e outro mergulho na Praia da Oura em que cometi o erro de mergulhar sem fato de neoprene, acreditando que a água do Algarve era acolhedoramente temperada, quando isso apenas acontece em bons dias e a temperatura mesmo assim é apenas suportável nos primeiros 2 metros a partir da superfície, pois a partir daí é muito fria, nessa Oura quase que entrei em hipotermia e parei os mergulhos por vários anos.
Depois pensei que seria possível entrar com o equipamento de mergulho na praia de S.Gabriel, ao pé de Albufeira, para ver o fundo rochoso a uns 2 ou 3 metros de profundidade sem o incómodo de ter que vir respirar à superfície, mas o equipamento é pesado para transportar do carro estacionado até à beira-mar e o espectáculo de entrada e saída da água atraía excessivas atenções de umas dezenas de banhistas. Desisti depois do segundo episódio.
Tirei então a carta de marinheiro pensando que talvez no ano seguinte comprasse um barco a motor para mergulhar a partir dele em vez de duma praia algarvia em Agosto, que era quando podia ter férias.
Porém, durante o exame prático para a carta de marinheiro gostei tanto de conduzir um semi-rígido na ria em frente a Portimão que acabei por comprar logo a seguir o semi-rígido de 4,2 metros que aparece na foto acima, provavelmente sobreequipado com um motor fora-de-borda de 40 cavalos uma vez que para venda nessa altura, no fim da época, não existiam motores de 25 cavalos em stock.
Existem problenas logísticos consideráveis na guarda de um barco para quem não dispõe de garagem como é o meu caso. Felizmente encontrei um amigo que disponibilizou metade da garagem que tinha próximo da albufeira de Castelo do Bode, onde passei a guardar o barco durante todo o ano, excepto no mês de Agosto em que ia para o Algarve.
Foi numa das idas a Castelo do Bode que tirei a primeira foto que tenho do barco. A seguir mostro um filho a fazer mono-ski nesse lago em Abril de 1996, numa superfície aquática que parecia seda, quando comparada com as ondinhas quase sempre presentes na ria do Arade na Praia da Rocha entre os dois molhes, onde eu me iniciara a fazer ski aquático há muitos anos, puxado por barcos de alguns amigos.
Guiar o barco com esta potência sentado ao lado do motor era incómodo pelo que passados dois anos encomendei instalação de um banco e de um volante para facilitar a manobra.
Uma das pessoas que viajava no barco queixava-se no mar, onde existe quase sempre alguma ondulação, quando o barco ia muito depressa que dava muitos saltos, quando se diminuía a velocidade que se sentia o cheiro a combustível queimado pois o barco não se afastava suficientemente depressa dos gases de escape. Quando, para obviar a esses inconvenientes se parava, queixava-se do balanço.
Passei então a privilegiar no Verão as viagens pela ria do Arade acima até Silves, mantendo algumas idas à albufeira de Castelo do Bode fora de Agosto. Estas idas acabaram quando foi interditado o uso de motores a dois tempos em Castelo do Bode, albufeira de onde se extrai muita água para consumo humano, designadamente para Lisboa.
Desde a aquisição do barco que me deparei com os melhoramentos contínuos da legislação sobre embarcações de recreio. Em cada ano em Agosto costumava gastar cerca de duas das quatro semanas de férias a tratar da obtenção de novas palamentas, de certificados, e a pagar novas licenças e taxas diligentemente criadas desde o ano que passara.
O barco não foi para a água num ano em que só passei duas semanas no Algarve e desde essa altura esteve parado numa garagem algarvia posta à disposição. Achei que já não iria andar mais naquele barco atingindo assim, de acordo com o cliché, o segundo momento de alegria na posse de um barco: o momento da venda, o primeiro tinha sido o momento da compra.
Vou tentar fazer um segundo post, sobre as viagens a Silves neste barco, pois este já vai muito longo.
(*) Adenda: recebi entretanto um comentário de um amigo ex-colega sobre o barco da 1ª foto que afinal em vez de ser um moliceiro é um mercantel:
«
Destes ainda percebo alguma coisa, pois são originais da terra dos meus avós.
O barco da foto não é um moliceiro, mas sim um mercantel. O moliceiro tem o bordo muito baixo para facilitar a faina da apanha das ditas algas a que chamamos moliço. Depois da carga atingir o topo do bordo eram colocadas umas anteparas de madeira com os respetivos vedantes o que permite continuar a carregar a embarcação navegando esta com a linha de agua acima do bordo sem no entanto se afundar. A manobra destes barcos era relativamente complicada para navegar à vela, porque não tinham quilha, a qual era substituída por uma prancha de madeira amovível colocada na lateral da embarcação, para evitar o deslocamento lateral quando o vento não era de ré. Requer uma tripulação de pelo menos dois elementos mas normalmente eram três.
Já o mercantel tinha por missão o transporte do sal das marinhas, do local de produção para os locais de armazenamento ou de embarque para exportação. Tinham o bordo significativamente mais alto, muito maior capacidade de transporte e eram mais estáveis e pesados, embora usassem também a prancha lateral para navegarem à vela.
Julgo que a razão desta embarcação estar no rio Arade se prende com o facto deste estar muito assoreado e ser mais facilmente navegável por uma embarcação de fundo chato, o que requer menos calado para navegar.
Estas embarcações estão em vias de extinção mas há ainda quem as conserve para passeios de família o que requer gastos significativos. Nas primeiras semanas de Setembro é costume haver uma competição de moliceiros na Torreira no decorrer das festas em honra de São Paio.
Já tenho nalgumas horas de navegação neste tipo de barco, e quando é propulsionado pelo vento é uma viagem muito agradável.
»
Sem comentários:
Enviar um comentário