2025-09-14

Julgamento de Bolsonaro e cúmplices


Comparando com os EUA (Estados Unidos da América) e com Portugal, foi extraordinária a rapidez do julgamento do ex-presidente do Brasil Jair Bolsonaro e seus cúmplices bem como a velocidade com que foram recolhidas as provas e produzidas as acusações relativas à grave perturbação da ordem pública incluindo invasão e depredação dos edifícios na Praça dos Três Poderes em Brasília onde se situam o Palácio do Planalto (Poder executivo), o Supremo Tribunal Federal (Poder judicial) e o Palácio do Congresso Nacional (Poder legislativo).

Referi-me aos desacatos ocorridos em Brasília em 8/Jan/2023 no post ”Percepção, Realidade e Brasília em 8 de Janeiro de 2023”, desacatos que foram a ponta do iceberg dum golpe de estado como disse então:
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No Brasil, há muito tempo que parecia que se preparava uma insurreição, possivelmente parecida à musa inspiradora principal do Brasil que são os Estados Unidos da América (do Norte, como costuma completar uma amiga brasileira) onde ocorreu uma invasão parecida de edifícios das instituições democráticas por uma multidão em 06Jan/2021, mais explicitamente instigada por um anterior presidente.
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A propósito da separação de poderes localizei 3 posts neste blogue de que faço citações

1) O juiz Neto de Moura e a separação dos poderes legislativo e judicial (Novembro/2017)

2) O misterioso caso dos 6 jovens portugueses contra 32 estados (Outubro/2023)
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Na minha qualidade de cidadão comum tenho constatado que cada poder costuma, no exercício da sua actividade, extravasar a sua área de actuação entrando por áreas que estão reservadas aos outros dois.
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3) Kilmar Abrego-Garcia (Abril/2025)
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… que o sistema judicial americano mostrou a sua fraqueza ao ser incapaz de o acusar (Donald Trump) e julgar pela sua recusa em aceitar os resultados da eleição presidencial de 2020 e pelo incitamento público e óbvio aos acontecimentos de 06Jan2021 com a invasão do Capitólio tentando impedir a homologação da eleição que tinha perdido. O seu incitamento evidente foi confirmado, se dúvidas houvera, pelo perdão presidencial concedido a todos os participantes na insurreição mal tomou posse em Janeiro/2025.

Os “checks and balances” tão persistentemente referidos e louvados sobre a fortaleza da democracia dos Estados Unidos da América do Norte revelaram-se afinal frágeis e ineficazes pois o poder legislativo obedece cegamente ao poder executivo do presidente, e o poder judicial se tem mostrado impotente de forçar o poder executivo a seguir a legislação americana em vigor.

A separação dos poderes legislativo, executivo e judicial é condição necessária para existir democracia, o poder legislativo tem a obrigação de fazer leis justas e claras para que os cidadãos conheçam os seus direitos e deveres, o executivo os seus poderes e respectivos limites e o poder judicial esteja em condições de aplicar sanções das leis existentes quando elas sejam violadas. 

Na ausência desta separação cai-se na situação actual de dificuldade de fazer investimentos pois a sua rentabilidade dependerá completamente, ou excessivamentwe, dos humores do Rei Absoluto dos Estados Unidos da América em que se está a tornar Donald Trump, por enquanto de jure apenas presidente eleito dos EUA mas já de facto autoridade de que quase tudo depende.

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Está de parabéns o Brasil por ter conseguido em tempo útil condenar os responsáveis por uma tentativa mal sucedida de golpe de estado, processo judicial talvez não por acaso concluído em 11/Setembro/2025, exactamente 52 anos depois da execução do golpe de estado do general Pinochet no Chile em 11/Setembro/1973 como oportunamente recordou o embaixador Seixas da Costa neste post .

Do colectivo de 5 juízes 4 votaram a favor da condenação e um contra, este último com argumentação sobretudo técnica que, a ser considerada, levaria facilmente a um comentário semelhante ao emitido no jornal “El País” em 2017-06-02 sobre um específico processo criminal em Portugal :
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De los miles de millones de euros desaparecidos nada se sabe, aunque el proceso movió 25 millones de documentos y recogió 170 testimonios. Quien crea que quien la hace la paga hasta en Portugal es un biempensante, pues Oliveira Costa solo ha pasado ocho meses en la cárcel y es difícil que vuelva. Sus abogados han anunciado que recurrirán la sentencia del juicio iniciado en 2010, por lo que continuará en libertad hasta que se vean todos los recursos posibles en todas las instancias posibles. Hasta seis años, tres si los jueces se dan prisa (¿quééé?). Es decir que Oliveira Costa, el banquero con la mayor condena de la historia, podría seguir libre hasta 2023, cuando cumplirá los 88 años de edad. En Portugal quien la hace la paga, si goza de buena salud.
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Não acredito que Bolsonaro cumpra os 27 anos e 3 meses de prisão efectiva a que foi condenado, provavelmente a actual legislatura tentará uma amnistia e o próximo presidente eleito poderá também amnistiá-lo, um dos candidatos já fez essa promessa. Talvez o sistema judicial brasileiro seja excessivamente rápido, o actual presidente Lula foi detido, julgado e condenado após seus mandatos presidenciais por acções durante a sua presidência. Depois de passar algum tempo na prisão o processo em que foi condenado foi anulado pelo Supremo Tribunal Federal, foi libertado e ganhou nova eleição para presidente.

Trump aplicou uma tarifa aduaneira ao Brasil enquanto não anulasse o julgamento de Bolsonaro, comunicando essa decisão por carta que o presidente Lula devolveu ao remetente. À parte a desfaçatez do império americano querer intervir num processo a decorrer no sistema judicial do Brasil, percebe-se o incómodo de Trump. Se o sistema judicial norte-americano fosse tão eficaz e justo como o brasileiro ele estaria por esta altura numa prisão americana.

1 comentário:

Luís Lucena disse...

Ñão há dúvida que a Justiça brasileira foi muito rápida no julgamento e condenação do Bolsonaro, sem interferência do poder legislativo. Mas na prática não é bem assim, porque o Congresso pode aprovar, por meio duma amnistia, uma redução da pena (e também a anulação total ?).
Quanto aos Estados Unidos, é melhor não falar. porque a Justiça é lenta, sobretudo quando o reu tem dinheiro, ou peso político. E o STJ é de facto "independente", mas os juizes são escolhidos, para um mandato vitalício, pelo Presidente que na altura está no poder.
Tudo é mais simples na Rússia, porque os três poderes estão nas mãos do Putin...