Acabei de ler a republicação pelo jornal Expresso desta obra de Jaime Cortesão que já referi aqui.
Tenho uma ligeira obsessão pelas datas dos documentos, quanto mais não seja como critério de último recurso para os classificar e noto que nas edições portuguesas existe geralmente pouca consideração por esta informação. Por exemplo nesta edição refere-se apenas que foi impressa em Março/2016, sendo omissa quanto à data da primeira publicação.
Vi na pág.797 do Volume VII uma referência às comemorações do V Centenário da morte do Infante D.Henrique que ocorreram em 1959 e dado que o autor faleceu em 1960 o original foi concluído entre estes dois eventos.
Trata-se portanto de um texto escrito há 57 anos, período de tempo que o torna mais adequado para os historiadores do que para o público em geral. Em tempos li que a História tinha que ser revista periodicamente, tendo-me nessa altura começado a aperceber que a História é a perspectiva que as gerações do presente têm do passado e que a visão que se tem se vai alterando, não só pelos factos que se ignoravam e que foram descobertos como pelo maior ou menor interesse que cada face da realidade vai tendo para quem vive no presente.
Em casos mais extremos, por exemplo como aconteceu na Rússia em que os governantes apagaram das fotografias as imagens de dirigentes caídos em desgraça, na Alemanha nazi em que se queimaram livros ou noutros países, como na China durante a Revolução Cultural, de onde se dizia que “na China o passado é imprevisível” existe também a tentativa de alteração dos registos do passado pelos poderes do presente. George Orwell escreveu magistralmente sobre isso no romance “1984”uma tentativa parcialmente bem sucedida de vacina contra regimes totalitários.
Mas mesmo sem estes casos extremos convivo actualmente muito bem com o pensamento de que “o nosso conhecimento futuro do passado é imprevisível” que por vezes se abrevia para “o passado é imprevisível”.
O nosso conhecimento dos Descobrimentos Portugueses é perturbado pela aplicação do segredo que as autoridades usavam para impedir o acesso dos concorrentes potenciais às terras onde existiam as mercadorias valiosas, para não falar da contra-informação também usada pelos portugueses para induzir em erro a concorrência.
Abrangido pelo segredo estava naturalmente o conhecimento geográfico que se traduzia em mapas que por vezes eram roubados por entidades externas de que um dos melhores exemplos é este mapa designado “Planisfério de Cantino”
“obtido clandestinamente em Portugal em 1502” e enviado para Itália onde se encontra actualmente.
Outro suporte dos descobrimentos foi a caravela,
uma embarcação desenvolvida em Portugal a partir dos barcos mouros de pesca, bem adaptada para as viagens de exploração do oceano pela sua agilidade na progressão contra o vento e cuja venda a estrangeiros esteve proibida pelo rei.
Depois de falar sobre os (des)conhecimentos geográficos e civilizações do final da Idade Média, designadamente as Ameríndias, as dos Berberes, da África Negra, do Islão e do seu domínio do comércio de longo curso com a Índia e a China a obra aborda o papel importante que teve a Ordem dos Franciscanos na reabertura do Cristianismo ao mundo, trocando o ideal do asceta vivendo enclausurado num mosteiro preparando-se para a vida eterna pelo ideal de viver fora do claustro levando o exemplo de Cristo ao povo e aos infiéis, traduzindo no nível religioso a mudança de uma economia fechada para uma economia mercantil. Nas caravelas costumava ir sempre um franciscano.
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