2010-12-12

Qibla

A disposição da mesquita do Imã (chamada “do Xá” até há pouco tempo) na praça Naqsh-e-Jahan em Isfahan, referida no post anterior, chamou-me outra vez a atenção para a necessidade de as mesquitas estarem orientadas para Meca. Entretanto vi aqui uma conjectura que o eixo da praça foi colocado não colinear com o da mesquita para permitir que, na vista da mesquita a partir da praça,  o portal da entrada não tapasse a cúpula. De qualquer forma fui verificar se o eixo principal da mesquita estava alinhado com a direcção de Meca no Google Earth, obtendo estas imagens:




que mostram a mesma recta com diferentes zooms. O facto de o eixo da mesquita não coincidir exactamente com a direcção de Meca levou-me a investigar mais um pouco esta questão.




A direcção de Meca chama-se Qibla e a necessidade da sua determinação contribuiu em tempos para o progresso da matemática nos países islâmicos.


 
Um dos métodos referidos que achei muito interessante baseia-se no facto de Meca estar entre os trópicos (21º 25’N) pelo que existem dois dias por ano em que o sol passa pela vertical do lugar. Dada a curvatura da Terra, as sombras de estacas verticais noutros sítios nesse instante estão na direcção de Meca.


Fiz a figura ao lado para ilustrar a situação em que o Sol está na vertical de Meca, em que o círculo de cima corresponde a uma projecção vertical e o círculo de baixo a uma projecção horizontal.


O método tem várias limitações, sendo a primeira que o evento só ocorre dois dias por ano, depois é necessário conhecer a longitude do lugar, para saber quando ocorre o meio-dia solar em Meca, é preciso que nesses dias raros o céu não esteja nublado e, finalmente, nesses momentos as sombras tenderão a ser pequenas, facilitando a introdução de erros.




Nos tempos actuais claro que existem muitos sítios na Internet dedicados ao cálculo da qibla para cada lugar, muitas vezes mostrando um mapa.




Por exemplo neste sítio dizem que a qibla a partir de Isfahan é 133º54’W.

Este ângulo é medido no sentido contrário ao movimento dos ponteiros do relógio enquanto no Google Earth adoptam o sentido do movimento.

Se fizermos o complementar de 360º obtemos 226º04’ou 226.24º, valor muito parecido aos 226.14º que obtive no Google Earth para a orientação da “recta” (trata-se de um círculo máximo) que marquei a unir Isfahan e Meca.

Como nestas divagações tomei conhecimento que, enquanto a maioria dos muçulmanos consideram o círculo máximo (ortodrómica) entre um local e Meca como a qibla desse local, existe uma corrente minoritária que considera que se deve tomar a loxodrómica (Rhumb line ou linha de rumo) entre esse local e Meca, ainda fui a outro sítio onde calculam quer a ortodrómica quer a loxodrómica.


Enquanto o azimute da ortodrómica em Isfahan deu 226º 05’, um valor muito parecido com os dois valores referidos acima, a loxodrómica tem um azimute de 223º09’. Neste caso as linhas ortodrómica e loxodrómica são muito próximas mas possíveis de distinguir nos mapas das figuras.





Qualquer dos valores é mesmo assim bastante diferente da orientação do eixo da mesquita de que tenho estado a falar e que é 212,8º, conforme se pode constatar na figura abaixo



Fui verificar a orientação da Mesquita Jameh de Isfahan (a mesquita principal ou da sexta-feira, o dia de descanso do Islão) e obtive 215,2º. Qualquer uma destas mesquitas foram construídas há muito tempo, quando era muito mais difícil determinar a direcção exacta de Meca.

Ainda passei por aqui, onde referem que várias pessoas têm usado o Google Earth para verificar o alinhamento das mesquitas, constatando que nem sempre é perfeito.

Finalmente verifiquei no Google Earth o alinhamento da nova mesquita de Casablanca, construída há poucos anos, e constatei que o seu alinhamento tem uma grande exactidão, suportando assim a minha conjectura que os erros de alinhamento de mesquitas muito antigas revelam as dificuldades que existiram de calcular a qibla com exactidão.

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