Gostei deste texto do D.José Tolentino de Mendonça que li neste sítio do jornal Expresso:
“Os avós são mestres de uma arte esplêndida e rara: a arte de ser. Os avós sabem tornar um mero encontro quotidiano numa apetitosa celebração. Sabem olhar e olhar-nos sem pressas, vendo-nos esperançosamente mais adiante. Sabem dar valor às coisas de nada. Nunca consideram que quando se entretêm connosco estão a perder tempo, muito pelo contrário. Sabem que o amor dá-se bem com essa gratuita codivisão. Os avós são docemente silenciosos, mesmo se muito tagarelas. Os avós parecem distraídos, e isso é bom. Os avós caminham a nosso lado sem pressa. Têm tanto de distante como de próximo no arco do tempo. Têm uma sabedoria que se expressa por histórias calorosas e não por conceitos. Têm uma memória que nos parece inesgotável, cheia de aventuras, de bagatelas e de detalhes para divertir. Têm armários carregados de objetos (alguns incompreensíveis) que nos põem a sonhar. Apresentam-nos a gostos e a sabores que passamos a identificar com eles. Os avós já foram muitas vezes aos lugares onde nos levam pela primeira vez.
Chamam a atenção para coisas incalculáveis, como a forma de uma nuvem ou a cor diferente que ganham as folhas. Ensinam-nos com serenidade, colocando-se a nosso lado. Nunca acham despropositada a fantasia, nem os medos, nem o mimo. Têm o sentido das pequenas coisas e colos onde cabem as grandes. Eles não separam, como o resto das pessoas, aquilo que é útil do que é inútil. Fazem-nos sentir que é assim, que já passaram por isso e que existe uma solução que nos vão revelar, só a nós, como um grande segredo. Amparam os nossos desequilíbrios com o corrimão invisível e seguro do seu afeto, disponíveis degrau a degrau. Adivinham o que não dizemos sem se confundirem com a nossa confusão. Quando não estão connosco, pensam em nós, repetem aos amigos as frases que dissemos, disputam-nos, orgulham-se de coisas parvas, como o modo como sorrimos ou respiramos. Penso que se sentimos tão intensamente que os devemos salvar é porque percebemos, desde muito cedo, que somos salvos por eles”.