Voltei-me a cansar dos termos em que é discutida a crise Grega, da contabilidade de cedências pelas partes em confronto. Usam também uma técnica retórica clássica que consiste em atribuir ao adversário opiniões que ele não defende para depois ou atacar essas opiniões ou dizer que o adversário já mudou de opinião. A outra técnica é referir a nossa opinião como a “realidade”, confundindo a natureza imutável por exemplo das leis da fisica ou as relações matemáticas com as “leis económicas” onde a vontade e psicologia humanas têm em grande número de casos um papel muito importante.
Em relação à semana passada por um lado parece-me que o Syriza exagerou na agressividade da abordagem aos países do Eurogrupo. Por outro lado considero monstruosas algumas das medidas tomadas na Grécia sob pressão da troika, designadamente a lei em que os desempregados perdem o acesso ao Sistema Nacional de Saúde poucos meses depois de ficarem no desemprego e a circunstância de 300 000 famílias não terem meios para pagar a conta da electricidade.
Só para corrigir estas duas situações completamente aberrantes, “olimpicamente” ignoradas pela direita que aparece na TV portuguesa a falar sobre a crise grega, já valeria a pena ter escolhido o Syriza para governar a Grécia. O Eurogrupo concedeu algum tempo ao governo grego e aguardemos pelo desenrolar dos próximos capítulos.
A propósito deste tema não consigo deixar de pensar no Amartya Sen e no seu livro “Poverty and Famines, An Essay on Entitlement and Deprivation”, um livro que referi aqui.
Uma das teses interessantes de Amartya Sen é que nas democracias não se morre à fome porque os governantes têm pressões fortes para não deixar morrer os seus eleitores.
Neste caso grego parece-me que a União Europeia se tem comportado como uma potência colonial, por exemplo como a Inglaterra em relação à fome de Bengala em 1945. A democracia “ressuscitou” na Grécia indo provavelmente evitar que os desempregados quando doentes não tenham assistência médica, que morram à fome, que fiquem sem casa e que não possam aceder à electricidade.
Quando se observa a mudança de opinião recente de Vítor Bento em relação a várias características da política económica prevalecente na União Europeia existem razões para acreditar que outros economistas e políticos poderão também mudar de opinião e que pode ocorrer uma inflexão em vários aspectos da política actualmente em vigor.
Dado que há tanta gente a falar sobre estes temas vou mudar de assunto mostrando esta bela imagem
que vi nesta referência a uma exposição no lendário hotel Mamounia de Marraquexe.
Cheguei a ela por um caminho improvável que começou a propósito dos 50 anos da morte de Winston Churchill e de se falar das suas pinturas e do seu gosto pela luz de Marraquexe, passando pelo seu relacionamento com o poeta e pintor marroquino Hassan el Glaoui de quem é esta imagem bem como a que se segue, com cavalos em movimento. Os azuis da primeira pintura fizeram-me pensar na casa azul dos jardins da Majorelle
Na exposição do Mamounia mostram também este quadro que Churchill pintou em Marraquexe
Nesta divagação fui dar ao site da filha do pintor marroquino que se chama Ghizlan el Glaoui e que também se dedica à pintura.
Gostei desta imagem de mulher com cabelo cor de fogo que vi no site da pintora
mas ao ver no mesmo site esta variante do famoso quadro de Vermeer, “Rapariga com brinco de pérola” ou talvez da foto da Scarlett Johansson no filme que contribuiu para uma ainda maior fama do referido quadro
fiquei a pensar que possivelmente o quadro de cima também seria uma variante doutro quadro famoso. Procurei no Google as “Three Graces” referidas na imagem e fui dar a um dos detalhes famosos do quadro da Primavera de Botticelli com as 3 graças, passando a mostrar primeiro o quadro
seguido de um detalhe com as Três Graças
onde constatei que as imagens do site da pintora que mostro em baixo são realmente variações ou reinterpretações das Graças de Botticelli:
Diz na Wikipédia que as Graças são:
- Ἀγλαΐα (Aglaia- ‘a resplandecente’, ‘a que brilha’, ‘a ‘a esplêndida’) era a mais jovem e bela das três Graças, simbolizando a inteligência, o poder criativo e a intuição do intelecto;
- Εὐφροσύνη (Euphrosina- personificação da alegria);
- Θαλία (Tália- em inglês diz que era a deusa da abundância, dos banquetes, em português que era a deusa do brotar das flores.
Não consigo distinguir quem é qual.
Estas imagens de Ghizlan el Glaoui, se bem que inspiradas pelas graças de Botticelli, não são uma cópia. Não sei como se chama uma reinterpretação de uma pintura, como é feito aqui. Suponho que seja muito mais complexo do que o simples uso de umas ferramentas informáticas que transformam uma fotografia numa aguarela, numa pintura a óleo, etc.
A divisão em quadrados das imagens fez-me pensar nos mosaicos bizantinos e nas suas interpretações contemporãneas, como por exemplo do cipriota George Kotsonis que referi aqui.
Acho positiva esta entrada de marroquinos pela representação pictórica de seres humanos, o risco destas imagens se tranformarem em ídolos é verdadeiramente pequeno.
E gostei de falar da influência das civilizações do Mediterrâneo na nossa visão do mundo.