Mas o que me chamou a atenção foram aqueles pinheiros, que me fazem lembrar uns candelabros israelitas, com uns tufos verdes no fim de ramos compridos e curvos sem derivações intermédias. Disseram-me que se chamava pinheiro-do-paraná. Num restaurante da cidade comi uns pinhões desta árvore, que são do tamanho de feijões.
Passados uns anos fui visitar um amigo e antigo colega do IST a Maringá (22°19'34.00"S, 44°34'37.00"W) uma pequena povoação na fronteira entre os estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, a uns 30 km da cidade de Resende, esta última a meio caminho entre o Rio e São Paulo. Quando me aproximava da povoação, situada a uns 1100m de altitude, voltei a avistar estas árvores simpáticas, primeiro nesta estrada de montanha
e depois neste ambiente verdejante e fresco
com noites que em Agosto se aproximam por vezes dos 0ºC, para consolo das Paulistas e Cariocas, que podem finalmente vestir os seus casacos de peles.
O meu amigo, que opera a Pousada Cabanas do Visconde, um conjunto de cerca de uma dúzia de simpáticos chalés com um aspecto alpino, bem integrados na paisagem como se constata na foto
chamava Araucária a estas árvores que eu conhecia como pinheiro-do-paraná. Referiu-me a particularidade de saírem 5 ramos de um nó de cada vez.
O meu conceito de Araucária era o desta árvore aqui à direita, muito frequente nos jardins das vivendas portuguesas, tem a particularidade de desenvolver um plano de ramos por ano (constatei depois que cada plano tem 5 ramos) tornando fácil saber quantos anos a árvore tem e, caso se plante uma quando se termina a construção da casa, fica-se também a saber a idade da casa.
A árvore adapta-se bem ao nosso clima, incluindo zonas batidas por vento marinho
Esta foto foi tirada na Praia da Rocha, em Set/2005 após chegada do Brasil, vendo-se ao centro uma árvore quase completa e do lado direito, num plano mais próximo, umas ramagens de outra árvore da mesma espécie.
Acho que a diferença de aspecto do pinheiro-do-paraná e do que eu conhecia por Araucária explicam bem a minha perplexidade, no uso de um mesmo nome para árvores com aspectos tão diferentes. Mas na altura, documentada a diferença para enviar num e-mail, que não me lembro se concretizei, abandonei o assunto.
Em finais de Abril deste ano, neste post sobre o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, mostrei uma árvore que considerei com um aspecto “despenteado” e na altura dei um salto ao Jardim Tropical de Lisboa (ao pé do Mosteiro dos Jerónimos) para verificar se uma árvore que lá tinha visto há algum tempo seria parecida a esta “despenteada que acabo de referir e que mostro do lado esquerdo enquanto a do lado direito é a do Jardim Tropical de Lisboa
Ainda tirei outra foto à árvore da direita, com um zoom ligeiro sobre a copa:
Acho que as duas árvores não são da mesma espécie, continuo sem saber o nome da da esquerda mas a da direita tinha uma tabuleta dizendo:
O ressurgimento da palavra Araucaria para uma nova árvore, diferente do pinheiro-do-paraná e daquela que eu continuava a chamar Araucária foi o impulso necessário para consultar a indispensável Wikipédia para esclarecer o assunto.
Assim comecei por procurar um wiki do pinheiro-do-paraná tendo encontrado um artigo completíssimo, muito mais completo na versão portuguesa do que na inglesa, que esclarece logo no início que «O pinheiro-do-paraná [Araucaria angustifolia (Bertol.) Kuntze 1898] é a espécie arbórea dominante da floresta ombrófila mista, ocorrendo majoritariamente no sul do Brasil mas também em pequenos trechos da Argentina e Paraguai, sendo conhecida por muitos nomes populares, entre eles pinheiro-brasileiro e araucária; ... »
Passando a procurar Araucaria constatei a existência de 19 espécies de Araucária, todas nativas do hemisfério Sul, com espécies nativas em “Nova Caledônia (onde treze espécies são endêmicas), Ilha Norfolk, sudeste da Austrália, Nova Guiné, Argentina, Chile, e sul e parte do sudeste do Brasil.”.
Rapidamente cheguei à Araucaria cunninghamii, neste caso e nesta data só disponível em inglês dado que se trata duma espécie nativa no leste da Austrália e na Nova Guiné e finalmente à Araucaria heterophylla ou Pinheiro de Norfolk (da ilha de Norfolk, na Austrália), que tem exactamente a mesma pinta da Araucária tão frequente em Portugal como se pode constatar na imagem que segue que fui buscar à Wikipedia.
A Ilha de Norfolk é uma pequena ilha (34km2, 2000 habitantes, a maioria descendentes dos amotinados da Bounty que vieram para aqui da ilha de Pitcairn) administrada pela Austrália, de que dista cerca de 1400 km.
A árvore consta mesmo na bandeira desse território relativamente autónomo que tem resistido a se integrar completamente na Austrália.
A presença de plantas aparentadas em lugares tão distantes é uma das evidências da História da Terra, em que plantas com antepassados comuns foram divergindo umas das outras mas mantendo traços que revelam o seu parentesco.
As plantas usam o vento, as correntes marítimas e, desde há muito tempo os animais, sobretudo as aves e os insectos, para a sua disseminação. Mas quando conseguem que o homem se interesse por elas, a sua disseminação pode assumir aspectos verdadeiramente extraordinários quando uma pessoa pensa neles.
Tem o seu quê de maravilhoso constatar que todas estas araucárias, tão comuns nos quintais das vivendas portuguesas de que mostro um conjunto na Avenida Almirante Gago Coutinho em Lisboa
são descendentes de plantas todas originárias da pequena ilha de Norfolk, nos antípodas, isolada no meio do Oceano Pacífico a centenas de quilómetros da terra mais próxima.