2025-11-30

Sobre o 25 de Novembro

 

Na altura morava na rua Sampaio e Pina ao lado dos estúdios do Rádio Clube Português, rua que era frequentemente ocupada pela classe operária e estudantes progressistas que vinham corajosamente defender os estúdios contra algum ataque reaccionário.

Nessa noite a rua estava deserta, bloqueada nos topos por camiões da tropa onde se viam alguns soldados e interpretei a ausência de multidões e o bloqueio por tropas como indicando que a situação era desta vez mais séria.

Receei que a minha mulher, na fase final da gestação, pudessse ter que sair de casa em urgência para a clínica do parto e que então estivesse a decorrer algum tiroteio, sendo insensato nessa altura esperar que os contendores fizessem um curto cessar-fogo para que eu, a minha mulher e a minha sogra saíssemos da rua em segurança para o carro estacionado na rua Castilho.

Saímos portanto preventivamente antes que começassem os tiros, que afinal não foram trocados nesse sítio, para ir dormir à casa dos meus pais em Arroios, passando primeiro pela clínica na Alameda Afonso Henriques onde a minha mulher já teve que ficar, nascendo a criança por volta das 00:30 do dia 26/Nov, indo depois eu e a minha sogra, em violação do recolher obrigatório, de carro até Arroios.

Lembro-me de ter apreciado o que se foi sabendo sobre a actuação do presidente da República, general Costa Gomes e de ter visto na TV a declaração de Melo Antunes de que o PCP continuaria a ser um partido legal, contrariando assim as pretensões de quem pretendia ver esse partido ilegalizado. Deve ter sido uma declaração importante pois não me lembro de mais nenhuma das numerosas declarações feitas nessa altura.

Gostei de ouvir o programa "Olhe que não, olhe que não", uma conversa semanal entre Francisco Seixas da Costa e Jaime Nogueira Pinto, desta vez dedicado ao tema "50 anos do 25 de Novembro".

Gostei também da entrevista que Vasco Lourenço deu na passada sexta-feira no programa Semanário episódio 6 de 28/Nov/2025, a partir do instante 01:20 (um minuto e vinte segundos) até ao 23:50.

Julgo que foi pouco depois do 25/Nov/1975 que deixei de ouvir os boletins horários do Rádio Clube Português por ausência de notícias de conhecimento urgente com o regresso a uma maior normelidade.

 

Concordo com Vasco Lourenço que as comemorações do 25/Nov em 2025 foram exageradas mas concluo transcrevendo a última parte da coluna semanal de Ricardo Costa no Expresso de 21/Nov/2025

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O 25 de Abril não tem nada de difuso. Marca a rutura total com o Estado Novo: a rendição de Marcello Caetano a Spínola no Quartel do Carmo assinala o fim de um regime e o início de outro. Menorizar este primeiro dia é um absurdo histórico. O momento zero da democracia é aquele. Comemorar o 25 de Abril é uma obrigação do regime.

Comemorar o 25 de Novembro não é uma obrigação mas é um dever. A data não marca o início de um regime, mas a garantia de que a democracia — tinha havido eleições livres sete meses antes e a Constitui­ção estava a ser escrita — se ia instalar e de que não ia haver guerra civil. Sem esse arranjo de forças, não teríamos sido uma democracia plena.

Disputar as duas datas é um jogo infantil. Equipará-las, um ato forçado. Recordá-las, um exemplo de maturidade.

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2025-11-27

As Ilhas e as Vilas

 

Na semana passada fui fazer "prova de vida" para continuar a ter acesso a transportes públicos gratuitos  em Lisboa, na minha condição de residente na cidade, com mais de 65 anos. É necessária uma visita presencial eufemisticamente chamada "validação do desconto", neste caso de 100% para continuar a viajar gratuitamente.

Há dois anos que faço esta validação no quiosque da Carris no Arco do Cego, em Novembro pois quando tentei agendar em Out/2023 só consegui vaga em Novembro. Este mês é melhor para revalidar pois em Outubro chegam muitos estudantes, para tratar de obter estes descontos pela primeira vez, que saturam os balcões de atendimento. 

Agora o quiosque da Carris está encerrado para obras, não existindo previsão publicada de conclusão das mesmas, situação banal, assim como é banal que a previsão de conclusão seja ultrapassada mas, mesmo assim, não acho que quer esta ausência de data quer a sua ultrapassagem por tempos da ordem de grandeza da duração da obra seja compatível com um país que se diz "desenvolvido".

Fui então à loja do cidadão sobre o Mercado do Saldanha, onde fui atendido no balcão da Carris em menos de um quarto de hora sem necessidade de agendamento.

Depois fui a pé pela Almirante Barroso, Pascoal de Melo e Almirante Reis até ao Metro da Alameda, tomando nota do abundante pequeno comércio e da recuperação de muitos prédios que há umas décadas tinham passado por estados deploráveis e da quantidade de lojas que mudou de ramo de actividade.

No nº111 da Rua Pascoal de Melo vi este acesso ao interior de quarteirão limitado por um portão que se encontrava aberto como na imagem que obtive no GoogleMaps



Entrei pelo corredor movido pela curiosidade, com receio de encontrar a miséria das antigas "ilhas" da cidade do Porto.

Fui agradavelmente surpreendido pela limpeza e organizaçao do local, com fiadas de casas e automóveis em bom estado que presumo serem de residentes. Não tirei fotos na altura mas procurei depois na internet e encontrei referência a esta Vila Luz em S.Jorge de Arroios (Fig.19) numa Dissertação para o grau de mestre em Arquitectura onde referem numerosas Vilas Operárias em Lisboa.

Neste blogue tem mais fotos do local aparentemento a ser requalificado (Set/2013) e noutro sítio da net confirma que as casas desta Vila foram objecto de requalificação. Dado que não existe actividade industrial nas proximidades já não serão habitadas por operários.

 

 

 

No Google Maps enquadrei esta Vila  

constatando que a área de cada  telhado da fiada de 5 casas na parte de baixo da imagem tem uma área de 100m2. Não sei se seriam unidades unifamiliares.

Esta área é um valor muito diferente dos 16 m2 de cada lar de uma ilha da cidade do Porto, com um sanitário para cada cinco fogos como refere este artigo da Wikipédia intitulado"Ilha (bairro)". Nasci no Porto em 1949 e vivi lá até 1959 quando a família se mudou para Lisboa. Tinha portanto menos de 10 anos quando vi uma dessas ilhas do Porto, do lado esquerdo quem desce a Rua da Boavista, antes do cruzamento com a rua do Barão de Forrester, provavelmente na Rua das Águas Férreas onde existe agora o Bairro da Bouça. Das ilhas que eu raramente entrevi então no Porto ficou-me a impressão de zonas caóticas, acanhadas, infectas e imundas que me horrorizaram. Foi uma das pesadas heranças do Salazarismo em Portugal. 

Provavelmente alguns dos meus colegas de turma na Escola pública nº 72 que frequentei no fim da Rua de Álvares Cabral, ao pé da igreja de Cedofeita antiga, que andavam descalços (dizia-se então de pata descalça) viviam nessas ilhas.

Conforme refere na Wikipédia Ilha (bairro) ouve um esforço prolongado no tempo de realojamento dos habitantes das ilhas para bairros sociais. As ilhas costumavam existir no centro da cidade, os seus habitantes não teriam dinheiro para os transportes públicos, mas seria muito difícil construir as habitações sociais de realojamento próximo das ilhas existentes.

Neste artigo do Observador sobre as ilhas típicas do Porto apresento a imagem respectiva

  


uma espécie de versão Disneylândia da realidade. Achei engraçada e potencialmente uma boa ideia recolher a água da chuva no telhado em tanques de lavar a roupa. Mas com o aparecimento de lavandarias automáticas funcionando com moedas ou cartões, até no parque de estacionamento do LIDL em Portimão, custa-me a acreditar que estes tanques venham a ser usados para lavar roupa, serão provavelmente um elemento decorativo. Se as ilhas reais tivessem este aspecto até não seriam más de todo mas, a sua utilização para morada permanente dum casal com filhos, dificilmente seria tão adequada como para um quarto de casal num alojamento local de curta duração. É portanto conveniente para turistas e estudantes mas inadequado para famílias.

Em Lisboa a situação das famílias mais pobres resolvia-se com a sobrelotação das casas existentes e com o aparecimento dos bairros de barracas como a Curraleira, por trás da rua Barão de Sabrosa e tantas outras em Lisboa e na sua periferia, designadamente em leitos de cheia no concelho de Loures onde morreram centenas na escuridão de uma noite de muita chuva em 1967. Houve dois números que eu fixei, em 1965 apenas 14% dos lares em Lisboa dispunham de instalações sanitárias, segundo disseram numa aula de Religião e Moral no 6º ou 7º ano do liceu. Nos fins da década de 60 cerca de 25000 pessoas chegavam por ano vindas da província para habitar na capital, citando homilia duma missa na igreja de Arroios. Nessa década 1 milhão de portugueses emigrou para a Europa, o país perdeu cerca de 10% da sua população.

Em Lisboa fizeram-se bairros sociais imensos como, por exemplo, na zona de Chelas e Marvila, a província urbanizou-se tardiamente, em todas as cidades e vilas vêem-se bairros sociais de construção recente, onde foram aplicados fundos da CEE. Resumindo um inglês, ao ver tanta construção pelo país fora disse que quando Portugal estivesse concluído iria ficar muito bonito.

Outra actividade em que se usaram os fundos europeus foi no saneamento básico. A situação era tão má que a urbanização intensa por exemplo de Oeiras, com prédios de andares onde anteriormente quase só existiam vivendas, teve como consequência a interdição para banhos da praia de Oeiras à semelhança da quase totalidade das praias da linha do Estoril durante décadas, como consequência dos esgotos pluviais servirem também para escoamento dos esgotos domésticos.

A separação das redes de esgotos domésticos e pluviais e a instalação e operação bem sucedida das estações de tratamento de esgotos foi outra das actividades importantes e dispendiosas em que foram empregues os famosos fundos da CEE, que não foram só aplicados no melhoramento das estradas e na construção algo excessiva da rede de autoestradas.

Receei que a citação simples no texto acima de dois números memorizados (14% e 25000) criassem dúvidas sobre a sua validade. Pelo menos o primeiro é confirmado em "Portugal Social em Mudança - 50 anos do 25 de Abril" da Universidade de Lisboa de que cito este pequeno excerto:

« Esta situação adquire contornos mais calamitosos se medida em percentagem da população. Segundo um estudo sectorial sobre o saneamento básico em Portugal, desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde (1975), o país terá chegado à década de 70 do século XX com apenas cerca de 40% da
população servida por abastecimento domiciliário de água, e não mais de 17% ligada à rede de esgotos (Schmidt 2009)
»

Foi por isso com satisfação que passei noutro dia pela rua do Sol ao Rato em que o 15A dá acesso à Vila Visconde Santo Ambrósio onde fotografei estas lindas casinhas cuja área no GoogleEarth dá cerca de 55m2, possivelmente também para turistas e/ou estudantes


 Na mesma rua do Sol ao Rato gostei desde prédio no nº 24

 

com a empena pintada toda em azul ultramarino, no mesmo tom da fachada, a confundir-se com o céu.

Não podia deixar de me lembrar da casa no jardim Majorelle em Marraquexe cujas plantas iluminadas mostrei aqui e da sua casa azul de que falei aqui de que mostro uma foto retirada da  Wikipédia "Jardin Majorelle"

 

Photo par ViaultTravail personnel


2025-11-20

Flores em jarra sob raio de sol em sala de espera

 


Para amadores é sempre difícil fotografar motivos sob um raio de sol intenso, há sempre partes que ficam sobre-expostas. O HDR (High Dymamic Resolution) da câmara do telemóvel ajuda, mas ainda ainda ficaram partes sobre-expostas.

Mostro a seguir um detalhe da mesma foto.

 

As flores eram naturais, de tão perfeitas receei que fossem de plástico.

 

 

2025-11-13

A cidade subterrânea (2)

 

Desta vez foi uma obra que tem requerido escavadoras com alguma dimensão na Av. Cidade de Luanda, entre a Rua Cidade de Bissau e a Av. de Pádua. Fotografei em 11/Nov/2025 mas as escavações começaram há mais dias.

Trabalhadores presentes disseram-me que se tratava dum problema numa conduta de água, que se constata na foto estar bastante profunda, talvez uns 6 ou 7 metros


O que achei aqui curioso foi a presença duma caleira de cimento de secção rectangular , por cima da conduta, que foi preciso segurar com uma viga de aço onde foram passadas cintas suspendendo a caleira que me disseram conter cabos de comunicações.

Por cima da caleira ainda existiam uns cabos eléctricos enterrados talvez sinalizados por cima com algum plástico.

Como mostra esta foto, A cidade subterrânea, que referi neste post, é difícil de gerir mas faz-nos imensa falta.

 

Adenda em 19/Nov/2025:

Constatando hoje que os trabalhos ainda não estavam concluídos tirei outra foto, do mesmo lado da rua mas um pouco à direita do local em que tirara a foto de 22/Nov mostrada acima:


Não sei se inseriram a válvula que não se via na primeira foto. Disseram-me que a obra se devia a uma fuga de água que ainda não estava completamente resolvida.

Por curiosidade submeti esta imagem ao Google Images e obtive a seguinte "AI Overview":

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The image shows a large concrete or reinforced concrete pipe exposed during excavation work, likely for infrastructure maintenance or replacement. 

The pipe is part of a water or sewage management system, crucial for urban infrastructure. 

A blue valve assembly is visible on top of the pipe, suggesting the infrastructure is operational or being prepared for service. 

The excavation is supported by a temporary shoring system, possibly a coffer-dam or trench box, to ensure worker safety and prevent collapse. 

A worker in a high-visibility vest can be seen inside the trench near the pipe.

» 

Pareceu-me uma descrição muito razoável e sucinta duma imagem complexa. Depois submeti este texto ao Google Tradutor que forneceu a versão em Português de Portugal:

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A imagem mostra um grande tubo de betão ou betão armado exposto durante uma escavação, provavelmente para manutenção ou substituição de infraestruturas.

O tubo faz parte de um sistema de gestão de água ou esgotos, crucial para as infraestruturas urbanas.

Uma válvula azul é visível na parte superior do tubo, sugerindo que a infraestrutura está operacional ou a ser preparada para entrar em funcionamento.

A escavação é suportada por um sistema de escoramento temporário, eventualmente uma ensecadeira ou caixa de vala, para garantir a segurança dos trabalhadores e evitar derrocadas.

Um trabalhador com colete refletor pode ser visto dentro da vala, junto ao tubo.

»

Para este tipo de textos  o tradutor parece completamente satisfatório.