2016-11-09

What Happened?


Há muitos anos no filme “Tootsie” o amigo encenador de teatro da personagem do Dustin Hoffman dizia-lhe que o seu objectivo, quando preparava uma peça de teatro para exibição, era tentar que os espectadores, ao fim de uma ou duas horas de espectáculo, saíssem da sala perguntando uns para os outros “What happened?”.

Quer no caso do Brexit quer ontem deitei-me um pouco mais cedo do que habitualmente.

Como no Brexit as projecções apontavam fortemente no princípio para a vitória da permanência no Reino Unido na União Europeia e no fim da contagem se observou o oposto, desta vez quando me fui deitar já não acreditava que a eleição de Hillary Clinton estivesse segura. Projecções económicas e políticas são as novas previsões da meteorologia, merecem pouco ou nenhum crédito.

Ouvi um bocadinho do discurso de vitória do Donald Trump e constatei (ainda com alguma surpresa) que afinal, ao contrário do que dissera há poucos dias num dos debates com a Hillary, de que a poria na cadeia quando chegasse a presidente, considerava que ela tinha sido uma grande lutadora durante a campanha e que o país lhe devia muito devido aos serviços relevantes que lhe tinha prestado.

Constatei assim que uma suspeita que se vinha avolumando sobre a minha incapacidade de compreender o discurso político, sobretudo na fase pré-eleitoral, se confirma cada vez mais. Notei isso quando Durão Barroso garantiu que não aumentaria os impostos para afinal encontrar o país de tanga e se “ver obrigado” a aumentá-los, depois com as contradições de Sócrates amplamente documentadas em Youtubes da net, seguidas do que me pareciam contradições de Passos Coelho mas estas últimas tão fortes que passei a considerar que o que ele dizia não tinha significado e culminando agora em Donald Trump.

Dado que cerca de metade dos eleitores americanos que se manifestaram nas urnas votou num candidato que disse coisas inacreditáveis durante a campanha, prefiro acreditar (uma questão de fé) que boa parte dessa gente possui uma chave interpretativa que lhes permite conhecer as verdadeiras intenções de Donald Trump, a partir dos dislates que vai dizendo. Pela minha parte irei estar atento durante algum tempo a ver se acedo a essa descodificação.

Entretanto constato que o Partido Republicano controla agora a Presidência, o Senado, a Câmara dos Representantes e dentro em breve também o Supremo Tribunal.

Os Estados Unidos da América têm zonas muito problemáticas, de que é exemplo esta estação de combóios na cidade de Detroit, encontrada aqui que são um dos factores explicativos possíveis.




Depois de seleccionar esta foto pensei que seria natural que na capital que foi do automóvel os combóios não saíssem muito bem tratados mas toda a cidade está em declínio, com pouca gente e muito crime.


Na Wikipédia tem este artigo sobre desigualdade de rendimentos nos EUA de onde retirei este gráfico



onde se constata que foi no início dos anos 90 que o rendimento mediano das famílias deixou de acompanhar o aumento da produtividade. É provável que seja o resultado das reformas do republicano Ronald Reagan que presidiu de 1981 a 1989, mas os democratas que estiveram no poder desde então não conseguiram inverter esta tendência. Isto seria outra possível explicação para a escolha dum candidato “de fora do sistema político”.


1 comentário:

Miguel disse...

E' desde o inicio dos anos 70 que a curva do rendimento deixa de acompanhar a da produtividade - o declive muito menor da primeira e' bem visível no gráfico. Tomando o gráfico pelo seu valor facial, seria um fenomeno anterior ao Reagan, aparentemente.