Em meados do passado mês de Maio fui a uma reunião em Madrid. Chegando de véspera passei pela entrada do Museu da Rainha Sofia muito ao fim da tarde (depois das 19h), mais pelo passeio de antes do jantar do que pela expectativa de que estivesse aberto. Neste caso poderia visitar a exposição do Salvador Dali que talvez me ajudasse a compreender melhor a situação surreal em que se encontra a sociedade portuguesa.
Claro que o museu estava fechado mas fui surpreendido por um sinal de indicação turística em que estava afixado “Museu Rainha Sofia” em espanhol, em inglês e também em caracteres chineses.
Na manhã do dia seguinte constatei no hotel que, além dos jornais espanhóis e dos habituais mensageiros da importância anglo-saxónica, designadamente o Finantial Times, o Wall Street Journal e talvez o USA Today, estava disponível também desta vez o que presumo que fosse um exemplar do jornal ChinaDaily referido na Wikipédia aqui, com várias notícias sobre a China e sobre o Mundo, vistos numa perspectiva chinesa.
Regressei de Espanha a pensar que nuestros hermanos estavam muito activos nas relações sino-espanholas, lembrei-me que uns netos do rei andam a aprender mandarim mas não pensei mais no assunto.
Na passada quinta-feira, ao chegar ao aeroporto da Portela vindo de outra reunião reparei neste anúncio à chegada
de que destaco o canto inferior direito na imagem seguinte
Talvez tenha andado distraído mas foi a primeira vez que reparei em Portugal no uso de caracteres chineses num cartaz publicitário. Claro que se vêem ideogramas nos restaurantes chineses e nas lojas chinesas que vão abrindo em muitos sítios mas aí funcionam mais como símbolos de identificação da loja, enquanto aqui representam uma cortesia para potenciais clientes de língua chinesa.
Há muitos anos, as marcas de luxo da Europa começaram a incluir versões em japonês das suas mensagens publicitárias. Embora a escrita japonesa tenha uma grande complexidade, dada a coexistência de ideogramas (normalmente variantes japonesas de originais chineses) com a de dois tipos de silabários e ainda uma ou outra letra latina para acrónimos como CD ou DVD, os silabários serão talvez de uso mais frequente tendo os símbolos respectivos uma constituição mais simples do que os ideogramas chineses. Era a partir dessa simplicidade gráfica que eu conjecturava que se tratava de japonês.
Ultimamente não tenho reparado tanto em mensagens em japonês, não sei se isso será devido à crise económica em que está o Japão há cerca de duas décadas, se as marcas passaram a vender directamente no Japão, através de lojas ou mesmo da internet ou eventualmente por se ter tornado normal umas mensagens em japonês.
O aparecimento de mensagens publicitárias em chinês é um sinal claro do maior protagonismo que a China vem assumindo na cena mundial.
Para evitar sentir-me analfabeto em Portugal, repetindo a experiência que já tivera ao observar ideogramas nas visitas a Macau e à China, pensei em traduzir o conjunto de ideogramas mostrado acima mas antes fui à procura dos sinais que tinha visto ao pé do museu da Rainha Sofia, para ilustrar este post, visto que desta vez não tinha usado o telemóvel para fixar esses sinais.
O Google torna tudo mais fácil mas não torna tudo fácil, neste caso não consegui encontrar uma palavra portuguesa que descrevesse o sinal e muito menos uma espanhola.
Sinalética não me levou a lado nenhum e no site do museu Rainha Sofia tinham assuntos mais importantes para tratar do que as placas sinalizadoras ao pé da entrada.
Lembrei-me então do GoogleMaps e da “street view”, tendo obtido esta imagem aqui à direita, infelizmente sem discriminação suficiente para se conseguir ler o que se vê no sinal.
Usei então a imagem do sinal para procurar outras imagens através do Google Images mas esta não era suficientemente expressiva e continuava (como ainda continuo) sem saber que nome dar a este objecto.
Lembrei-me então de reduzir a imagem omitindo o pilar, como se vê à direita e desta vez tive mais sucesso localizando a imagem que vem a seguir e que encontrei aqui
Fui depois verificar no tradutor do Google como se diria “Prado Museum” em Chinês e deu-me esta sequência de caracteres: “普拉多博物馆”, enquanto a tradução para japonês deu esta “プラド美術館”, revelando que afinal, o que eu pensara ser chinês era japonês, restando apenas a pequena consolação que a sequência de ideogramas chineses tem um grafismo mais complexo do que o japonês, conforme eu pensava, bem como a confirmação da importância do turismo japonês em Espanha.
Regressando então ao projecto de compreensão da mensagem que mostrei acima e que volto a mostrar aqui
É fácil constatar no google tradutor que os 3 primeiros ideogramas correspondem a “Portugal”.
Os nomes dos países em chinês são normalmente constituídos por ideogramas associados a sons cujo conjunto forma um som parecido ao do nome do país. No caso de Portugal os sons são pu-tao-ya. O 4º e 5º caracteres significam “o maior” ou “largest”. O 6º significa “tempo”, enquanto os 7º e 8º significam “relógios”. A tradução de “cadeia de lojas" deu imediatamente a sequência dos 9º, 10º e 11º ideogramas, faltando apenas o significado dos 3 últimos caracteres, que mostro a seguir
e que deram algum trabalho, como verão.
Não se conhecendo o som associado ao carácter, desconhecendo portanto a transcrição fonética pin yin, não se consegue obter o carácter nos programas que existem para produzir ideogramas a partir do pin yin.
Resta assim o uso de programas de reconhecimento de caracteres, “optical caracter recognition”, naturalmente específicos para o chinês pois um programa para reconhecer caracteres do alfabeto latino não será aqui de grande utilidade.
Descobri um programa aqui que possibilita o reconhecimento de caracteres desenhados com o rato e foi usando este programa que reconheci o 1º desta série de 3 e que vi no google significar “feliz” ou “happy”
O uso do rato faz sempre os traços parecerem muito infantis mas neste caso é provável que o aspecto infantil não se deva apenas ao uso do rato mas também à absoluta falta de prática da caligrafia chinesa. Gostei muito de fazer os traços que mostro a seguir:
constatando com alegria que o ideograma correcto é a primeira sugestão do programa.
Não tive sucesso na identificação do 2º carácter mas o terceiro foi identificado na 2ª sugestão, marcada a amarelo:
O Google tradutor disse que este carácter queria dizer “você”
Para o 2º recorri a este programa de reconhecimento de caracteres que recebe como input ficheiros .jpg.
Trata-se do carácter “迎” que significa “boas-vindas”
Temos assim que literalmente o conjunto de 3 caracteres significa “feliz boas-vindas a você” ou “happy welcome you”. Eu diria que o “feliz” é aqui um elemento de realce ou para enfatizar as boas-vindas que além de boas deverão também ser felizes, talvez em português se pudesse dizer “Muito boas-vindas”, desconheço como se poderia realçar o “welcome” inglês. Notar que o 3º ideograma refere “você” pelo que em inglês a frase do cartaz está incompleta, deveria ser “Portugal’s largest watch chain welcomes you”, enquanto em português poderia ser “A maior cadeia de relojoarias de Portugal dá-lhe as boas-vindas”.
Na imagem a seguir mostro o resumo gráfico deste esforços de tradução
Um dia ainda vou perguntar a um chinês se estas minhas conjecturas estão correctas.
Entretanto vai-se constatando a esmerada educação chinesa. Enquanto para os lusófonos e anglófonos a Boutique dos Relógios se limita a dizer no cartaz que são os maiores em Portugal, quando se exprime em chinês diz além disso que deseja as boas-vindas!
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