2019-10-13

Entrevista de Amartya Sen na New Yorker




Li há poucos dias uma entrevista do Amartya Sen (nascido em 1933) para a New Yorker intitulada “Amartya Sen’s Hopes and Fears for Indian Democracy”, economista indiano laureado com o prémio nobel de que sou fã e que tenho referido nalguns posts deste blogue.

Nela foi mais uma vez referida a importância da democracia na supressão das formas mais extremas de fome que levavam à morte em massa de milhares ou mesmo milhões de pessoas numa dada região.

Ele mostrou que a presence de uma fome mortal numa sociedade democrática é imediatamente combatida com sucesso pelo governo da ocasião, que não se pode dar ao luxo de perder quer directamente eleitores morrendo à fome quer indirectamente pelos sobreviventes descontentes.

Mas o tempo tem-lhe mostrado que outras injustiças tais como a subalimentação sistemática de partes da população, a frequente discriminação das mulheres ou a inexistência de boas escolas para a maioria das crianças são muito mais difíceis de combater, mesmo em regimes democráticos.




A propósito dos comunistas retirei este pequeno extracto:

«
And also, in terms of sympathy for the poor, I thought the communists had something really important to offer. On the other hand, I was always shocked by the absence of political theory. It is not often recognized that Marx had very little interest in political organization. This whole idea of the dictatorship of the proletariat really makes no sense whatsoever. [Laughs.] And, as John Kenneth Galbraith argued, you need opposition, what he called “countervailing power.” There is no countervailing power in their thinking.
»
que me atrevi a traduzir assim:
«
E também, em termos de simpatia pelos pobres, eu pensei que os comunistas tinham realmente algo importante para oferecer. Por outro lado, sempre me chocou a ausência de teoria política. É poucas vezes reconhecido  que Marx tinha muito pouco interesse em organização política. A própria ideia da ditadura do proletariado não faz nenhum sentido. [Risos.] E tal como John Keneth Galgraith argumentou, é precisa oposição, o que ele chamou “contra-poder”. Não existe contra-poder no pensamento deles.
»

Estas considerações apareciam num contexto de censura à política do actual primeiro-ministro da União Indiana, Narendra Modi, pela sua deriva hinduísta em detrimento das outras culturas que habitam no vasto território da União e do abuso da concentração do poder.

Pareceu-me uma coincidência interessante estas reflexões sobre a importância da oposição na altura das eleições legislativas em Portugal.

No caso do PS e também do PSD, parece-me que não basta existir oposição quando têm maioria absoluta pois, como nessas circunstâncias a oposição diz sempre mal de tudo o que fazem, acabam por não a ouvir.

A necessidade do partido do governo fazer alguma negociação com a oposição tempera as medidas que acabam por ter maior qualidade, como aconteceu em Portugal na legislatura de 2015-2019.

Espero que estes hábitos de negociação sistemática com a oposição perdurem na legislatura em que agora entramos.

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