2017-02-26

Newspeak, a Novilíngua


No livro de George Orwell 1984 o governo ditatorial usava a novilíngua, uma variante da língua original em que a mentira prevalecia sobre a verdade. Nessa novilíngua por exemplo o Ministério da Propaganda chamava-se Ministério da Verdade.

A luta política trava-se muitas vezes na tentativa de distorcer a língua para fazer passar por verdadeiras coisas que não o são mas quando se passam alguns limites pensamos no romance intitulado 1984.

Numa das últimas conferências de imprensa na Casa Branca, o porta-voz Sean Spicer barrou a entrada à BBC, à CNN, ao LA Times e ao New York Times.

Quando lhe perguntaram a razão da proibição explicou que era porque tinham "expanded the pool of reporters" (aumentado o conjunto de repórteres), conforme se pode ver no site da BBC

2017-02-25

Árvore sem uma unica folha


É um período breve em Lisboa, aquele em que existem árvores sem uma única folha, ficam sempre algumas folhas até Fevereiro e no início de Março ou mesmo antes aparecem os primeiros rebentos.

Por isso registei esta árvore, num "momento raro" no passado dia 22 de Fevereiro





2017-02-24

Dificuldades da língua chinesa


Continuando o post anterior em que aflorei vários aspectos da cultura chinesa a propósito de um livro sobre os caracteres chineses faltou-me referir que a caligrafia dos caracteres chineses está muito codificada.

Embora nos tempos que correm os chineses usem esferográficas, canetas, lápis e naturalmente dispositivos electrónicos para escrever, a “verdadeira” caligrafia não prescinde de um bom pincel, de tinta e de um tinteiro.

Um carácter compõe-se vários traços, como é analisado na imagem deste carácter 永que segue que significa “para sempre” e que retirei daqui mas que já vira noutros sítios



Cada traço tem um nome e estes são os 8 traços fundamentais. Cada traço deve ser colocado no papel segundo uma ordem bem definida, neste caso indicada pelos números a vermelho.

Conforme julgo ter dito noutro post, quando uma vez eu estava a escrever alguns da dúzia de caracteres chineses que conheço, disseram-me que eu não estava a escrever os caracteres mas a desenhá-los. Li algures que quando os caracteres são introduzidos num PC alguns chineses usam aspas na expressão: ele “escreveu” esta frase no PC.

Existem depois traços “compostos” que também são muito usados, tendo cada um o seu nome, como se pode ver na tabela a seguir, que dos 8 traços de cima inclui (diǎn, héng, shù gōu (2 “subtraços”), piě, nà),  faltando (tí, wān).


A tabela que acabo de apresentar com 20 traços vinha num PowerPoint acompanhada dum texto em que referia a existência de 31 traços, na internet vi algures que existiam 37 traços, nada é simples nestes temas dos símbolos chineses.

Para escrever os caracteres com pincel e tinta existem também regras, na figura que segue (que retirei do livro "China, Empire of Living Symbols") mostra-se o ponto inicial onde o pincel deve ser colocado, a trajectória a seguir e os pontos em que se faz uma pausa antes de prosseguir até ao fim do traço.




Ao ler este artigo pensei nos textos do Miguel Sousa Tavares e na sua tendência para o exagero. Mas li com gosto até ao fim e destaco meia-dúzia de passagens:


-"Those who are actually attracted to the language precisely because of its daunting complexity and difficulty will never be disappointed."

- Acerca da existência da escrita tradicional (Taiwan e Hong-Kong) e simplificada: "...puts an absurd burden on the already absurdly burdened student of Chinese, who at this point would gladly trade places with Sisyphus."

- "Can you imagine three Ph.D. students in English at Harvard forgetting how to write the English word "sneeze"?? Yet this state of affairs is by no means uncommon in China."

- "Having never studied a day of Spanish, I could read a Spanish newspaper more easily than I could a Chinese newspaper after more than three years of studying Chinese."

- "Someone once said that learning Chinese is "a five-year lesson in humility". I used to think this meant that at the end of five years you will have mastered Chinese and learned humility along the way. However, now having studied Chinese for over six years, I have concluded that actually the phrase means that after five years your Chinese will still be abysmal, but at least you will have thoroughly learned humility."

2017-02-20

Mário Centeno


O ministro das finanças Mário Centeno deve ter prometido dispensa de declaração de rendimentos, património e cargos sociais aos futuros administradores da Caixa Geral de Depósitos.


Embora tenha feito esforços nesse sentido, designadamente com a aprovação do decreto-lei que isentava esses administradores de algumas das obrigações dos gestores públicos, não conseguiu o conjunto completo de alterações legais necessárias para os administradores ficarem isentos de prestar essas declarações.

Como consequência desse insucesso os administradores pediram a demissão e foi preciso nomear outros, o que foi feito com rapidez.

Os SMS do ministro nunca poderão ser o suporte material de um "Acordo" entre um ministro da República Portuguesa e outras partes e nesse sentido, quer tratem de assuntos privados quer de assuntos públicos, não poderão ser usados em tribunal para averiguar da existência de um "Acordo".

Os SMS devem ser tratados como comunicações telefónicas, necessitando da intervenção dum juiz para serem gravados ("escutados").

Confundir uma promessa informal com um acordo é uma retórica usada pela oposição para tornar a vida difícil ao ministro que a oposição diz que "mentiu".

Estou farto desta discussão e preferia que já tivesse parado há muito tempo.

2017-02-17

Abacaxi descascado com técnica chinesa


Visto numa frutaria chinesa nos Olivais Sul, não será rápido requerendo paciência chinesa, mas fica espectacular!



2017-02-13

Algumas referências à China



Na minha busca, aparentemente sem fim, para perceber a razão de os chineses terem continuado a usar os seus ideogramas tão complicados comprei o  livro "China, Empire of Living Symbols", escrito por uma sueca chamada Cecilia Lindqvist, sinóloga que se dedicou ao estudo da evolução do grafismo e do sentido dos ideogramas chineses.


Gostei do livro como testemunho da cultura chinesa por exemplo, embora já tivesse visto algumas pedras com formas elaboradas nalguns templos chineses, não me tinha apercebido do grau de atenção que os chineses lhes podem dar, ao ponto de modificarem algumas expondo-as depois aos elementos para parecerem objecto de erosão natural (pág.65).


Na Wikipédia tem uma entrada sobre "Chinese Scholar´s Rocks" e fui buscar a este sítio o exemplo que mostro a seguir


Já me tinha apercebido que os chineses se dedicam à aquacultura de peixes de água doce mas não era para mim claro que os excrementos dos peixes fertilizassem as ervas de que se alimentam (pág.74).

Vi agora na Wikipédia a referência a "Aquaponia", combinação de aquacultura com hidroponia que além de passado poderá ter um interessante futuro como se vê numa instalação artesanal em Portugal nesta reportagem da RTP



e noutros sítios mais virados para o mercado googlando Aquaponics ou (urban aquaponics).

Também gostei deste vaso de bronze encontrado em Anyang, do período Shang (1766-1122A.C.) na página 84, onde se vê de frente uma cabeça de veado 


ou duas cabeças de veado de perfil



em que destaquei a cabeça da direita

Nas páginas noventa e tal aparecem vários cortes em papel em que os artesãos chineses são grandes peritos. Abaixo mostro uns recortes em papel que comprei na China, alusivos às 4 estações, que julgo estarem na ordem Primavera, Verão, Outono e Inverno






Para ver mais exemplos desta arte pode-se googlar (chinese paper cuts) ou ver este artigo da Wikipedia.

A partir das páginas 150 existem referências a jangadas de bambu, planta particularmente adequada também para esse efeito dado que os caules são ocos, e algumas referências aos juncos. Na página 153 existem referências apressadas aos descobrimentos Portugueses, minimizando o feito e julgando os comportamentos dos Portugueses de então com os padrões prevalecentes nos finais do século XX.

Existe um capítulo dedicado ao Cânhamo e à Seda (hemp and silk), fui ver o que seria o cânhamo, lembrava-me de me falaram nele no liceu, ou nas aulas de Geografia ou de História. Trata-se de uma planta com fibras longas e resistentes, usada pelos chineses quando inventaram o papel, e também para fazer tecidos, cordas e redes. Na Europa, segundo a enciclopédia luso-brasileira, o cânhamo foi destronado pela juta (Corchorus olitorius), por sua vez substituída por outras fibras vegetais e depois por fibras sintéticas derivadas do petróleo.

Neste sítio www.hemp.com tem uma história do cânhamo onde se refere que nos E.U.A. a legislação que distinguiu o cânhamo industrial da marijuana de 1937 até finais dos anos 60 deixou de o fazer nesta última data enquanto na Europa se considera essa diferença. A proibição de cultivo nalguns países da União Europeia foi abolida em 1998. Existem plantas do mesmo género Cannabis mas com conteúdos muito diferentes do psicoactivo Tetra-hidrocanabinol (THC).

Na página 214 do livro refere-se a batalha de Talas, que opôs exército dos Abássidas ao da dinastia Tang no ano de 751. Os muçulmanos ganharam, parando a expansão chinesa para Ocidente. É possível que a transmissão do conhecimento do fabrico de papel se tenha feito por essa altura, embora seja pouco provável que tenha acontecido durante a batalha. E ao ler sobre mais uma batalha importante de que nunca ouvira falar, uma pessoa volta a pensar que a história que aprendeu é eurocêntrica, se bem que fosse muito difícil que o não fosse.

Vi também decoração de janelas na página 295 e googlei (chinese lattice design) tendo chegado a este painel que encontrei aqui


Este tipo de painéis, além de serem decorativos, forneciam suporte para papel que deixava passar alguma luz dando ao mesmo tempo algum isolamento térmico.

Sobre os ideogramas a autora mostra as formas primitivas de diversos ideogramas, apresentando razões umas vezes verosímeis outras vezes com um apreciável grau de arbitrariedade.

Embora seja fácil estabelecer relações entre o ideograma que representa montanhas e este símbolo "",  à medida que nos aproximamos de conceitos mais abstractos a arbitrariedade da escolha do símbolo aumenta.

Os ideogramas serviram a função de agregar comunidades que falavam línguas muito diferentes mas criam dificuldades enormes na construção de dicionários em papel, pela dificuldade inultrapassável da ausência de uma ordem alfabética.

A definição do pin-yin, feita por um grupo coordenado por Zhou Youguang, permitiu a romanização do mandarim, a língua mais falada na RPC (República Popular da China). Esta romanização facilitou a alfabetização duma muito maior percentagem da população chinesa. Facilita também a introdução dos caracteres chineses nos computadores. A existência de computadores poderá prolongar a vida dos ideogramas cujo significado é agora mais fácil de procurar pois existem programas de reconhecimento de caracteres como o "Linedict", "Pleco" ou mesmo o Google Tradutor que além duma App para iOS e Android já inclui um identificador de caracteres também no PC,  que reconheceu facilmente os poucos caracteres chineses que eu consigo escrever.

Quando estive pela primeira vez em Macau pensei que seria prudente ser capaz de identificar o ideograma de "saída" (出口 ou só 出) e feminino (女) e masculino (男) para identificação da casa de banho adequada.

Curiosamente no capítulo deste livro dedicado a "Mankind" aparece no subcapítulo Mankind.person o ideograma 人 que significa "pessoa" ou "ser humano" e no subcapítulo Mankind.woman aparece o ideograma 女 e o ideograma para mãe 母, não sendo mostrado no capítulo do Mankind nem o ideograma de masculino nem o de pai (父). No subcapítulo Mankind.person aparece o ideograma 夫 que significa marido. Na categoria dos seres humanos o género masculino aparece assim como marido do ser do género feminino.

O carácter 男 (masculino) que deriva da agregação de 田 (campo agrícola) com 力 (força) aparece apenas no capítulo Farming.

O texto parece assim considerar que o homem tem duas funções, de esposo e de lavrador do campo e só na primeira, através do matrimónio, acede à categoria de ser humano. Fiquei a pensar que poderia existir aqui alguma misandria (90400 resultados na busca no Google, enquanto que misoginia tem 1.090.000).

O livro é interessante mas não me iluminou sobre a razão da persistência dos ideogramas ao longo de tantos séculos.

2017-02-07

Ficção científica


Os meus autores preferidos de ficção científica são o Isaac Asimov e o Arthur C.Clarke. Mas lembro-me de ter lido um ou dois livros do Robert A. Heinlein. Num deles recordo-me que um programa de "inteligência artificial" ganhara consciência e, ajudado por um informático humano, liderara uma revolta da colónia lunar em relação aos terráqueos colonizadores. Para assegurar uma boa comunicação entre o programa consciente e o público lunar tinha sido sintetizada uma figura humana que falava na TV lunar aos colonizados.

Algumas das histórias de ficção científica têm como base a repetição de padrões históricos no futuro, como é o caso deste em relação a relações coloniais.

Outra das características da histórias de ficção científica é a demonstração de que o futuro é muito dífícil de prever. Por exemplo num conto do Asimov havia um computador que acumulara tanta informação que era capaz de responder a perguntas cada vez mais complicadas sobre a existência do universo. Mas curiosamente continuava a comunicar através de fitas de papel perfurado, uma tecnologia do início dos computadores completamente ultrapassada pelas capacidades de interacção visual e auditiva das interfaces multimedia, enquanto a qualidade das respostas dos computadores a perguntas filosóficas continua no berço.

Lembrei-me disto a propósito deste comício do Jean-Luc Mélenchon que usou um holograma para aceder ao dom da ubiquidade, conseguindo estar em dois comícios em simultâneo em Lyon e em Paris, neste último lugar em presença via um holograma.

Um dia destes conseguirão sintetizar uma figura humana que poderá estar em muitos comícios em simultâneo. O difícil continuará a ser afinar um programa de inteligência artificial para fazer intervenções interessantes.

O Youtube da sessão é este:




De vez em quando refiro que nem sempre as traduções portuguesas são mais palavrosas que as inglesas. O romance do R.A.Heilein que refiro acima teve o título traduzido em Português para "Revolta na Lua" quando no original se chamava "The Moon Is a Harsh Mistress".


2017-02-01

O povo unido


Estas manifestações nos Estados Unidos da América deram-me a conhecer a versão em inglês da palavra de ordem tão frequente nas manifes durante o PREC (Processo Revolucionário Em Curso), depois do 25 de Abril de 1974. É " The people united will never be defeated":



conforme mostra esta manife em Nova Iorque contra as limitações à entrada de nacionais de 7 países, realizada há 1 ou 2 dias.

Em Portugal dizia-se " O povo unido jamais será vencido". Só passado algum tempo me apercebi que a frase tivera origem no Chile e vi agora na Wikipédia que  a frase"El pueblo unido jamas sera vencido" fora usada na campanha da eleição de Salvador Allende. No artigo da Wikipédia referem o uso em Portugal e em vários outros sítios.

Nos EUA corre outro tipo de PREC, o Processo Reaccionário Em Curso, esta manife é uma forma de resistência a esse PREC.