2008-10-28

Detesto praxes

Também detesto praxes. Quando entrei no Instituto Superior Técnico em Lisboa, no ano longínquo de 1966, existia uma semana de recepção ao caloiro, para ajudar a integrar os caloiros no novo ambiente. Faziam umas palestras e havia uns “convívios”, em que tocavam música nas instalações da Associação de Estudantes que se convertiam numa espécie de discoteca. Não era grande coisa mas os colegas mais velhos mostravam boa vontade e não havia qualquer espécie de praxe.

Considero que todas as tradições têm que ser justificadas, uma prática não se pode justificar pelo simples facto de ter sido executada uma ou muitas vezes mas neste caso nem sequer existe tradição em Lisboa e julgo que tão pouco no Porto. Eu associava a praxe à parte reaccionária e tradicionalista da Universidade de Coimbra que entretanto julgo que a aboliu na crise de 1969.

O elogio que fiz da cópia no post anterior não inclui a cópia acrítica de práticas abusivas da nossa dignidade.

Detesto tanto as praxes que nem consigo lembrar-me de uma imagem alusiva ao tema.

Detesto praxes.

2008-10-27

Elogio da cópia

A minha escolha do Egipto como referência para mostrar que era possível mudar a sociedade portuguesa de meados do século XX além de acidental (era a primeira civilização de que se falava na disciplina de História) é irónica pois nesta civilização as mudanças foram muito lentas.

Por exemplo, é impressionante a permanência das formas dos baixos relevos e das pinturas ao longo de centenas de anos, embora eu admita que esta frase soe mal a especialistas treinados em ver as diferenças que provavelmente foram sendo introduzidas na arte egípcia ao longo do tempo.

Claro que a originalidade, a mudança e a evolução são importantes mas por vezes podemo-nos esquecer da importância que também tem a cópia.

A utilização de elementos repetidos quer com fins decorativos, como nesta avenida processional com várias estátuas de carneiros representando Amon, o deus Sol, no seu templo em Karnak


quer com fins estruturais como neste conjunto de colunas idênticas num dos átrios do mesmo templo




continua a ser utilizada ainda hoje, estabelecendo ritmos sofisticados como nesta parte da Cidade das Artes e das Ciências de Valência projectada por Santiago Calatrava,





ou paredes móveis de grande dimensão como esta





neste edifício que faz lembrar uma joaninha






O ADN, cuja estrutura de dupla hélice está representada por este modelo espacial estilizado no átrio de outro edifício da Cidade das Artes e das Ciências serve precisamente para assegurar a reprodução de características que a selecção natural mostrou serem vantajosas


Por vezes esquecemo-nos que grande parte da força da vida reside precisamente na força da cópia.

2008-10-21

Esgotei as imagens do túmulo da Nofretari




Começo por agradecer ao Lutz o prémio Dardos que gentilmente me atribuiu aqui.

Estas cadeias de prémios são simpáticas mas partilham com os esquemas da pirâmide o problema da expansão exponencial: a certa altura esgotam-se os potenciais contemplados.

No meu caso, os blogs que eu contemplaria encontram-se na minha pequena lista de blogs e quase todos já foram contemplados pelo Lutz pelo que me dispenso de o fazer aqui.



Para sossego dos visitantes deste blogue quero informar que esgotei as imagens a cores do catálogo da exposição na Gulbenkian (em 1979) sobre a Nofretari pelo que este é o último post sobre o tema.

Não resisti a apresentar mais estas 3 imagens porque considero-as todas de uma grande beleza e não fui capaz de seleccionar uma em detrimento das outras.

Aqui ao lado temos o deus Osíris com os símbolos do poder real, coroas do alto e do baixo Egipto e uns ceptros.

Na figura seguinte vemos a Nofretari a fazer umas oferendas à deusa Isis confirmando assim que, quer os seres mortais quer os deuses, sempre gostaram de almoços grátis.

A última imagem tem a Nofretari mais o deus Hórus, que fica muito bem com a sua cabeça de falcão.






2008-10-18

Ainda o túmulo de Nofretari

No post anterior quebrei uma regra muito rígida da pintura egípcia ao representar o olho visto de lado em vez de visto de frente.

A versão tradicional parece incluir mais o espectador na cena da imagem, a rainha parece estar a olhar para o lado e ao mesmo tempo para o espectador, enquanto na versão alterada a Nofretari ignora o espectador completamente.

Surpreende-me que uma representação tão pouco natural seja tão bem aceite pelo nosso cérebro.

Surpreende-me também que este estilo tenha persistido durante tanto tempo com tão poucas mudanças quando, como acabei de mostrar, era tão fácil experimentar pequenas variações.

Continuo a mostrar pinturas do túmulo da rainha Nofretari, desta vez a rainha e ao lado a Isis e o Deus Ra (Sol) com uma cabeça de carneiro.




As explicações sobre o significado das figuras deixa-me sempre um bocado insatisfeito achando que é raro elas fazerem algum sentido.

La Palisse: é por estas imagens não fazerem sentido para ninguém actualmente vivo que esta civilização está extinta.

2008-10-16

Padrões fixos na pintura egípcia


No libreto da exposição da Gulbenkian de que falei no post anterior refere que os frescos do túmulo de Nofretari no Vale das Rainhas ao pé de Luxor foram realizados no século XIII AC e constituem o mais extraordinário exemplo de pintura mural da civilização egípcia que chegou até nós.

Na figura ao lado, obtida por um “scan” do libreto referido, é representada Nofretari oferecendo 4 tecidos, representados por YY invertidos, ao deus Ptah, mumificado e com a carne de cor verde que era a cor da ressureição.

As pinturas egípcias têm um estilo que as identifica com facilidade. Só há pouco tempo me apercebi (e foi por ter lido...) que uma das características mais marcantes é a representação sistemática das pessoas de perfil mas apresentando o olho visível sempre como se estivesse de frente.

Dadas as representações escultóricas bastante realistas que os egípcios nos deixaram, esta falta de realismo das pinturas (e dos baixos relevos) só podia ser propositada. Possivelmente consideravam que uma vez que a representação plana da realidade seria sempre incompleta deixavam o realismo para as esculturas, usando regras bastante rígidas nas representações pictóricas.

Foi essa rigidez que me apeteceu quebrar, representando também o olho de perfil, embora tenha caído numa representação mais convencional, sob o ponto de vista ocidental.





Na pintura ocidental este tipo de representação, em que duas vistas de perspectivas diferentes são apresentadas numa mesma imagem, só voltou a aparecer nas figuras cubistas de Picasso.

2008-10-13

A naturalização dos costumes e a civilização egípcia

A imagem do lado direito mostra a deusa Isis, protagonista do post anterior, conduzindo uma rainha egípcia para o reino dos mortos.

Quando em 1959 entrei no 1º ano (equivalente ao actual 5º ano de escolaridade) do liceu Camões, no anexo do Areeiro, era obrigatório levar gravata . Toda a sociedade seguia regras muito rígidas, com uma grande obsessão pelo que parecia bem e o que não parecia bem e um respeito enorme pela hierarquia.

“Honrar pai e mãe e outros legítimos superiores” era nessa altura a forma mais comum do quarto mandamento do Decálogo. Na versão actual do compêndio do Catecismo da Igreja Católica o mandamento diz apenas “Honrar pai e mãe”, embora nos comentários se afirme “...Os que estão submetidos à autoridade vejam os superiores como representantes de Deus e colaborem lealmente no bom funcionamento da vida pública e social...”.

(Nota: ao ir verificar o compêndio do Catecismo, julgava ir encontrar um texto expurgado da versão autoritária corrente no tempo do Salazar, não estava à espera deste “...vejam os superiores como representantes de Deus...”.)

Chateavam-me as visitas que se tinham que fazer a familiares, as salas de estar fechadas, reservadas para dias raros e de uma forma geral o ambiente abafado cuja descrição encontrei no Primo Basílio do Eça e que devia ser exacta porque fiquei a detestar esse romance.



Estas sociedades bloqueadas transmitem a ideia que as normas, costumes e relações entre as pessoas são realidades imutáveis, são a forma Natural. Daqui decorre a alegação que as coisas sempre foram assim e sempre hão de ser assim.

Foi com grande entusiasmo que nas aulas de História do 3º ano (actual 7º) tomei contacto com a civilização do Egipto dos faraós. Embora já me tivesse apercebido que alguns adereços comuns no passado, como por exemplo a espada com que costumava andar o D.Afonso Henriques, tivessem caído em desuso, as formas radicalmente diferentes de organização da sociedade egípcia em relação à nossa mostraram-me então claramente que as normas sociais se vão alterando ao longo do tempo.

As imagens deste post são do túmulo da rainha Nofretari (Nefertari em inglês), esposa favorita do faraó Ramsés II, túmulo esse que foi objecto duma exposição em 1979 na Fundação Gulbenkian, onde eram exibidas fotografias na escala 1:1 da totalidade do túmulo, montadas sobre painéis que reproduziam fielmente a forma do túmulo. Pena que esssa exposição não tenha passado a permanente pois seria óptima para ser visitada pelas escolas.






As duas imagens acima obtive-as aqui.


2008-10-04

Isis

Os braços das espirais lembraram-me os braços da deusa egípcia Isis numa imagem gravada no sarcófago do faraó Toutankamon e exposta no museu do Cairo.



Na visita que fiz em Abr/2006 tive que deixar a máquina fotográfica na entrada do museu pois era proibido entrar com ela. Quando já dentro do museu vi um visitante a tirar fotos com o telemóvel. Compreendo a proibição de usar flash, quer pelos eventuais danos às obras de arte quer pelo incómodo que causam aos outros visitantes. Tenho grande antipatia pela proibição de fotografar sem flash pelo que sucumbi à tentação de usar o telemóvel para fotografar a base do sarcófago de ouro do faraó Tutankamon.

Estando algo nervoso não configurei bem o telemóvel e o flash foi inadvertidamente accionado quando fotografei a figura alada da deusa Isis na base do sarcófago. Sendo o flash do telemóvel uma luz discreta é contudo conspícuo para os guardas da sala do museu pelo que fui imediatamente detectado e admoestado por um zeloso funcionário. Felizmente não houve mais consequências do que ficar com uma foto tirada em péssimas condições. Como gostava da figura fiz uns retoques para, por assim dizer, a fazer regressar à vida.

Depois achei que o "making of" dos retoques poderia dar uma sequência de imagens engraçada. Fiz um Power-Point mas como não é apresentável neste blogspot fiz agora um filme usando o "Windows Movie Maker". Espero que gostem do resultado:


2008-10-02

Espirais dos Girassóis - 2

Na realidade desenhar as espirais, usando a mesma folha excel em que se calculam as coordenadas de acordo com a fórmula de Helmut Vogel referida no post anterior, até não é muito difícil.










Cada ponto desta nuvem de 200 pontos tem um número de ordem, que aparece na fórmula. Começando no ponto 200 e subtraindo 34 de cada vez até chegar a um número menor ou igual a 34 obtém-se (o conjunto de pontos que constitui) a primeira espiral. Começa-se a segunda espiral tirando uma unidade a 200 e repetindo a subtracção de 34. As últimas 3 ou 4 espirais têm menos um ponto do que as primeiras. Fazendo copy and paste da 2ª espiral, deixando um espaço em branco entre cada rectângulo de valores e repetindo esta operação 33 vezes, o que ainda cabe dentro da minha paciência, obtém-se com uma série única (no sentido de "Chart series") toda uma família de espirais.

Fazendo uma coisa parecida para a família de 21 espirais, fica-se com o boneco da esquerda, de 200 pontos com 21 e 34 espirais.

Na imagem da esquerda mostro os mesmos 200 pontos unidos pelas 13 espirais que eram óbvias na nuvem de 100 pontos e que continuam a existir na nuvem de 200 pontos.

Isto mostra que à medida que aumenta o número de pontos da nuvem começam a ser visíveis um maior número de espirais. Faço notar que, por exemplo, as 34 espirais visíveis na nuvem de 200 pontos são praticamente invisíveis na nuvem de 100 pontos pois neste caso cada uma delas tem apenas 3 pontos.