2008-06-19

Os casais luso-alemães e a União Europeia

O casamento luso-alemão (ou germano-português) referido no post anterior fez-me pensar que antigamente estes casamentos internacionais eram muito mais raros do que actualmente.

Embora uma parte importante da sociedade em que vivemos se sinta bastante feliz em apregoar aos quatro ventos que as nossas condições de vida se estão constantemente a degradar, tal não corresponde ao que se pode verificar. Por exemplo, até nos casamentos se constata que a internacionalização, antes reservada quase exclusivamente à grande nobreza, está hoje largamente acessivel à classe média.

A facilidade com que actualmente se viajam milhares de quilómetros e os milhões de pessoas que o podem fazer com facilidade, o preço reduzido das chamadas telefónicas internacionais, quando comparado com o custo de há uns anos atrás, a existência da internet facilitando todo o tipo de contactos entre outros factores, têm aumentado a probabilidade de uniões entre pessoas de nacionalidades diferentes, permitindo ao mesmo tempo que o elemento que foi morar para fora do seu país mantenha uma ligação forte ao seu país de origem.

Neste contexto a União Europeia é uma necessidade cada vez mais imperiosa, cuja construção tem que ser aprofundada e que sofreu agora um revés com o referendo da Irlanda.

Quando eu era mais jovem lembro-me de as pessoas de esquerda serem muito contra os referendos, que diziam então ser um método não democrático usado pela direita para "impor" os seus pontos de vista. Talvez tal se devesse à memória de que a Constituição Portuguesa de 1933, que instituiu o Estado Novo, tinha sido aprovada por referendo.

Actualmente noto um entusiasmo por referendos, de preferência sucessivos, tendo todos a possibilidade anular uma dada iniciativa europeia. A análise feita na klepsydra parece-me mostrar bem a vantagem que os opositores da construção europeia pretendem obter, a partir da realização sucessiva de referendos em vários países.

Essa análise peca quanto a mim por alegar que os políticos ignoraram os perigos dos referendos. Julgo que já estavam bastante conscientes dos riscos que correriam e foi por isso que apenas houve referendo no único país em que o referendo era legalmente inevitável.

Aprecio a energia e a qualidade dos argumentos com que a Helena e o Lutz, membros de uniões luso-alemãs, defendem a União Europeia. Já as propostas que fazem de Assembleias Constituintes parecem-me um pouco "far-fetched". Eu alinharia nelas mas parece-me que será provavelmente mais fácil continuar com as ratificações do Tratado de Lisboa e entretanto encontrar uma forma de ultrapassar o problema criado pela Irlanda.

Também não seria má ideia que os irlandeses alterassem a constituição deles para deixarem de ter esta obrigação constante de fazer referendos que atrapalham toda a Europa.

Entretanto, depois deste parêntesis sobre referendos e sobre três casais luso-alemães (os dos bloggers e o do Imperador mais a Infanta) regresso às pinturas italianas dos tempos em que " ... art was something you had to take a ship to Italy to see", citando Susan Neiman no seu magnífico último livro "Moral Clarity".

Apresento assim a pintura de Perugino, na parede da Capela Sistina, em que Cristo entrega as chaves do Reino dos Céus a S.Pedro. Eu estava a pensar neste quadro quando afirmei num post anterior que "A Ecologia não tinha ainda ganho a importância actual e o que importava verdadeiramente eram os seres humanos, que apareciam em primeiro plano, muitas vezes num ambiente completamente urbano de uma praça, depois umas obras arquitectónicas e lá para o fundo a paisagem com umas árvores mais ou menos realistas."

Reparo ainda que já nessa altura, mesmo quando ocorriam eventos importantes como este mostrado na imagem, alguns dos dignitários próximos parecem distraídos e muita gente está a correr e a brincar, completamente a leste do portentoso evento.



A seguir mostro as árvores do fundo com mais destaque. A minha preferida é a do lado direito da figura da esquerda mas as outras também são bonitas.




1 comentário:

Helena Araújo disse...

Eu já tinha dito que duvido que o texto escrito pela assembleia constituinte fosse muito diferente, nos seus conteúdos, do texto do Tratado.


O post do Klepsydra é muito interessante. Não percebi aquelas contas do 90% de probabilidade em todos os países, mas deve ser problema meu - sempre tive dificuldades em perceber as lógicas da estatística.

Eu não tenho problema com a realização de referendos, desde que:
- as consequências atinjam o país que o realiza, e não os outros (no caso, o referendo irlandês devia ter perguntado: "quero que o meu país faça parte deste projecto?")
- as pessoas saibam o que está em causa
- (hoje estou a jogar alto) os políticos que fazem a campanha da desinformação sejam seriamente penalizados

Pelo que no entretanto percebi, o problema é que não há um plano B para o caso de algum país não aprovar. Depois da aprovação do Tratado é fácil sair da União, mas antes dela não é possível. Mais valia aprovar o tratado automaticamente, e fazer referendos em cada país, de preferência todos no mesmo dia, como propõe o Klepsydra (boa análise!), a perguntar se querem ficar ou se querem sair no dia 2 de Janeiro de 2009.